Estudo fez mapeamento relativo à inclusão de PcDs e reabilitados nos 20 municípios da Região Metropolitana de Campinas, interior de SP.
Os números do desemprego no Brasil, apesar da recente queda mostrada pelo IBGE, são tristes e indignos. Aproximadamente 11,3 milhões de brasileiros estão sem ocupação, taxa de 10,5% da População Economicamente Ativa no trimestre avaliado de fevereiro a abril último.
Na Região Metropolitana de Campinas (RMC) – interior de SP, essa taxa também oscila por volta dos 10%. São aproximadamente 250 mil pessoas buscando vagas – ou em desalento pela falta de perspectiva.
Transportando esse cenário para o universo ainda mais restrito e desafiador da Pessoa com Deficiência (PcD), o drama se aprofunda diante das dificuldades legais, da falta de cumprimento da legislação pelas empresas e do preconceito que ainda impera junto a esse profissional.
A jornalista e ativista Kátia Fonseca traduz esse cenário indicando que não há fórmulas prontas nem decisões mágicas para melhorar o cenário do emprego entre as pessoas com deficiência.
Em entrevista ao Portal Hora Campinas, ela disse que “mas há sim soluções”, afirma, com a convicção de quem tem décadas de militância pela causa. Ela é uma pessoa com deficiência física, ativista na defesa das pessoas com deficiência e membro do Centro de Vida Independente do Brasil (CVI-Brasil).
Ela pontua que a situação piorou ainda mais com a pandemia, que gerou impactos econômicos para todas as atividades. “As empresas resistem muito a cumprir a lei. Como sempre, no nosso País, não há punição, não há vigilância”, destaca. “Agora, depois da pandemia, piorou bastante esse quadro. Se já era difícil, ficou ainda mais”, detalha.
Debate
Esse tema mobilizou na última semana o Ministério Público do Trabalho (MPT) e o Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho (Cesit) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Na mesa, o debate sobre o emprego da pessoa com deficiência (PcD) na Região Metropolitana de Campinas (RMC).
O encontro contou com a presença de empresas, representantes de prefeituras, Conselhos Municipais de Direitos das Pessoas com Deficiência, Câmaras Municipais e entidades da sociedade civil.
Números
Segundo a pesquisa realizada pelo Cesit, em dados estimados para 2022, existe um total de 171.668 pessoas com deficiência na região metropolitana de Campinas.
As cidades de Campinas (66.721 pessoas), Sumaré (15.117) e Americana (12.960) são as que possuem a maior população de PcDs da RMC. A maior variação de aumento populacional deste público, comparando os anos de 2010 e 2022, são os municípios de Engenheiro Coelho (35,2% de aumento de PcDs), Paulínia (32,3%) e Holambra (32,2%).
Os dados populacionais de 2022 também apontam na RMC – Região Metropolitana de Campinas, um total de 101.309 pessoas com deficiência que têm idade entre 20 e 64 anos (potencialmente aptas ao trabalho), e 81.559 acima de 64 anos.
“Os números demonstram que a maioria das pessoas com deficiência da RMC estão em idade laboral, aptas a ingressar no mercado de trabalho, sendo boa parte dessa população composta por trabalhadores admitidos com Ensino Médio completo e Superior. Tal realidade é uma mostra de que a maior barreira que ainda se enfrenta no mundo do trabalho é a do preconceito e da falta de informação. As PcDs são tão capazes e competentes para o trabalho como qualquer outro trabalhador”, pontuou a procuradora Danielle Olivares Corrêa.
Cota legal
Com relação ao cumprimento da cota legal, em 2019, o estudo aponta que 874 empresas com mais de 100 empregados estão sediadas na RMC, localizadas principalmente em Campinas (38%), Indaiatuba (8,5%) e Americana (7,9%), todas no interior de SP. Destas, apenas 169 cumprem a cota de contratação de pessoas com deficiência e reabilitadas, ou 19,3% do total. A lei de cotas estabelece que empresas com 100 ou mais empregados devem obrigatoriamente preencher um percentual variável de 2% a 5% de seu quadro funcional com empregados que tenham algum tipo de deficiência ou sejam reabilitados do trabalho.
De acordo com a pesquisa, os municípios com maior percentual de empresas que cumprem a cota estão em Monte Mor (53,8% do total cumpre a cota), Pedreira (50%) e Indaiatuba (29,3%). Por outro lado, não foi identificado o cumprimento da cota em nenhuma empresa dos municípios de Santo Antônio da Posse, Morungaba e Engenheiro Coelho.
O estudo apontou que em 2019 estavam previstas 17.837 vagas para PcDs e reabilitados nos 20 municípios da RMC, em números absolutos, mas apenas 8.663 foram ocupadas (47,2%), gerando um gargalo de 9.174 vagas não ocupadas (52,8%).
Queda do emprego
A pesquisa também aponta que, somados os anos de 2020 e 2021, foram admitidas no mercado de trabalho da RMC 3.652 pessoas com algum tipo de deficiência (1.422 em 2020; 2.230 em 2021). Em relação à admissão por sexo, é maior entre os homens, com um total de 2.215 admitidos entre os anos de 2020 e 2021, especialmente nos municípios de Campinas (866), Americana (188) e Indaiatuba (147). Foram admitidas, no mesmo período, 1.437 mulheres com algum tipo de deficiência ou reabilitadas, com maior número de registros nos mesmos municípios: Campinas (691), Indaiatuba (98) e Americana (91), seguidos por Jaguariúna (82).
Entre 2020 e 2021, o número de PcDs e reabilitadas contratadas na RMC foi maior entre aqueles com grau de escolaridade intermediário, sendo 2.275 com ensino médio completo, 474 com curso superior completo e 248 com ensino fundamental completo.
Porém, de um ano para o outro, o número de desligamentos foi considerável, gerando um saldo negativo e apontando para o encerramento de vagas para este tipo de público. Em 2021, Campinas demitiu 960, Americana 200 e Indaiatuba 179.
É preciso fazer mais
Para a jornalista e ativista Kátia Fonseca, a realidade se impõe e é preciso fazer mais. “A questão do mercado de trabalho é bastante complexa. Não é só dar uma vaga para a pessoa com deficiência”, adverte. “Precisa haver um olhar mais transversal para essa parcela da população. Passa pela saúde, pela educação. Existem soluções. As próprias empresas podem promover cursos de qualificação, que banquem o transporte, que banquem a mensalidade. É preciso um olhar mais atento, mais humanidade, mais empatia. E que o governo faça a sua parte”, finaliza.
O que diz a Constituição
Previsto na Constituição da República de 1988, o amparo à pessoa com deficiência também está presente nas relações de trabalho desde a Consolidação de Leis do Trabalho (CLT) e, mais recentemente, foi consolidado no Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015).
De acordo com o estatuto, pessoa com deficiência é “aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”.
Prioridade processual
Pessoas com deficiência têm prioridade na fila de processos trabalhistas. Esse direito é assegurado pela Lei 12.008/2009 e também se estende a idosos e a cidadãos enfermos. Também está previsto no art. 9º, inciso VII, do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que determina o atendimento prioritário, “sobretudo com a finalidade de tramitação processual e procedimentos judiciais e administrativos em que for parte ou interessada, em todos os atos e diligências”. A preferência pode ser requisitada mediante requerimento ao juiz, do qual conste a comprovação da condição de saúde.
Cotas
De acordo com a Lei da Previdência Social (Lei 8.213/1991, artigo 93), as empresas com 100 ou mais empregados estão obrigadas a preencher de 2% a 5% de seus quadros com beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência. O parágrafo 1º do mesmo dispositivo condiciona a dispensa desses empregados à contratação de outro nas mesmas condições.
Segundo a Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do TST, o descumprimento dessa obrigação, caso haja culpa da empresa, pode levar à sua condenação ao pagamento de multa e de indenização por danos morais coletivos.
Fonte: https://horacampinas.com.br