A audiência pública realizada nessa terça-feira (30) na Câmara dos Deputados para discutir cancelamentos unilaterais de contratos da Unimed Nacional confirmou o movimento registrado já desde o final de abril pela presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), deputada Andréa Werner (PSB): a operadora tem realizado uma rescisão em massa de contratos coletivos com beneficiários mesmo em casos de pessoas em tratamento, conduta considerada ilegal pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça).
A parlamentar participou como convidada do evento, promovido pela comissão análoga no Legislativo Federal, presidida pelo deputado Márcio Jerry (PCdoB/MA). Ausente, o presidente da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), Paulo Rebello, foi representado por um dos diretores da agência de natureza fiscalizadora, Marcos Teixeira Brás.
O diretor informou aos presentes que a ANS realizou uma inspeção na sede da Unimed Nacional, na última sexta (26), face a informações veiculadas pela imprensa nacional de cancelamentos unilaterais de contratos de beneficiários com deficiência, sobretudo autistas, ou com doenças graves, como câncer. Desde 30 de abril deste ano, o gabinete de Andrea Werner na Alesp recebeu ao menos 250 denúncias de rescisões unilaterais desse tipo, a maior parte, referentes à Unimed Nacional.
De acordo com Brás, a Unimed Nacional reportou que foram 2.484 rescisões de contratos só este ano – uma média de 17 rescisões ao dia, considerada a data da inspeção na operadora. O mesmo dado foi comunicado pela Unimed Nacional ao Ministério Público de São Paulo, que, a pedido da parlamentar, instaurou inquérito para investigar os cancelamentos em massa, de pacientes em tratamento, realizados pela operadora e pela Bradesco Saúde. Outras operadoras, como Amil, Notre Dame, Interclínicas e São Cristóvão seguem em apuração pela promotoria.
Sobre pacientes autistas, tanto a ANS quanto o MP-SP receberam da Unimed a informação de que, só em 2023, foram 83 cancelamentos de contratos – prática que, defende o Núcleo Jurídico da parlamentar, fere o Tema 1082 do STJ, que veda interrupção de serviço em casos de pacientes em tratamento, como é o caso de autistas. Conforme o diretor da ANS, a agência requisitou à operadora documentos referentes aos 83 casos de pacientes autistas para análise. A Unimed tem até 2 de junho como prazo.
Para a deputada paulista, o número informado pela ANS e pela Unimed não corresponde à realidade. “Esse número é forjado. Apenas o nosso gabinete recebeu 86 relatos de pessoas autistas do estado de São Paulo que tiveram planos cancelados. É no mínimo estranho a Unimed citar 83 em todo o país”, avalia.
Rescisões são “medida rotineira” para dar “sustentabilidade”, diz Unimed – Presente à audiência remotamente, o diretor-presidente da Unimed Nacional, Luiz Paulo Torres Coimbra, que também é médico, admitiu os cancelamentos de contratos coletivos – a maior parte hoje, 80%, ele próprio informou, no quadro de clientes.
“Os cancelamentos de contratos, assim como a aceitação de novos contratos, são uma medida rotineira na sustentabilidade da operação. Faz parte do dia a dia da nossa atividade”, definiu Coimbra, que, em uma fala de 15 minutos, instantes antes, disser que “nossa grande questão de convicção pessoal é o compromisso com as pessoas”.
Para Werner, tanto as explicações de ANS quanto as da Unimed afrontam o interesse público coletivo. “A coisa mais errada que eu vejo é que a agência que deveria estar regulando esse mercado não está fazendo esse papel”, criticou. Semana passada, a parlamentar encaminhou ofício ao presidente da ANS indagando se a agência prevaricou na fiscalização de centenas de contratos rescindidos unilateralmente. A resposta ainda não foi encaminhada ao gabinete.
“O que estou vendo aí é plano comprando hospitais, fazendo fusões e aquisições, promovendo precarizações e descredenciando clínicas”, observou Andréa. “A gente está defendendo vidas, e, do outro lado, tem gente vendo dinheiro. Haja coragem ou cara de pau.”
Na véspera da audiência em Brasília, a deputada promoveu uma audiência pública em São Paulo com a presença do relator do PL dos Planos de Saúde na Câmara, Duarte Junior (PSB/MA). Ele espera apresentar o relatório dele à matéria até o próximo dia 7.
Na ocasião, Andréa apresentou quatro sugestões de inclusão ao relatório do parlamentar:
- Incluir as despesas de acompanhantes quando a internação em unidade de terapia intensiva ou similar de pacientes menores de 18 anos ou com deficiência, desde que haja prescrição médica;
- Em caso de ausência de profissional apto na rede credenciada, em caso de urgência ou emergência, ou em casos em que seja provada a impossibilidade de utilizar a rede credenciada, serviços próprios do plano de saúde locais referenciados pela operadora, o plano de saúde deve reembolsar integralmente a despesa em prazo máximo de 30 dias mediante apresentação de nota fiscal ou recibo simples;
- Fica descrito na lei que o cancelamento de apólices ou suspensão e rescisão unilaterais de contrato estão suspensas em qualquer hipótese durante internação ou tratamento de um dos beneficiários;
- Clínicas, hospitais e outros espaços de atendimento médico e tratamento podem ser descredenciados, desde que sejam substituídos por outro equivalente, e que a substituição seja avisada a todos os beneficiários e à ANS com um mínimo de 60 dias de antecedência — exceto se o descredenciamento ocorra por casos de fraude ou infrações a quaisquer normas sanitárias no fiscais. No caso da substituição de clínica por vontade da operadora e sem infração a normas sanitárias, se um beneficiário estiver internado, é necessário que a internação seja mantida e todas as despesas pagas até a alta hospitalar.