De acordo com a Agência Câmara, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei 3035/20, do deputado Alexandre Frota (PSDB-SP), que “institui a Política de Educação Especial e Inclusiva, para atendimento às pessoas com transtorno mental, transtorno do espectro autista (TEA), deficiência intelectual e deficiências múltiplas“.
De acordo com informações da Agência, entre os objetivos da política estão:
– oferecer oportunidades educacionais adequadas às necessidades dos alunos;
– definir a atuação interdisciplinar como ferramenta para o trabalho dos profissionais envolvidos; e
– estabelecer padrão mínimo para formação acadêmica e continuada de
profissionais e para a constituição de equipes multidisciplinares.
A proposta do parlamentar é que “as escolas da educação básica deverão promover a adaptação do ambiente, levando em consideração, além do déficit de mobilidade, a realidade neurossensorial e o comportamento do estudante, sem custos adicionais para pais ou responsáveis. As salas de aula com educandos que tenham transtorno mental, TEA, deficiência intelectual ou deficiências múltiplas deverão conter dois professores: um de educação regular; e um especialista em educação especial, para aplicação
efetiva do plano educacional individual do aluno”.
Para o parlamentar, “cada cidadão com deficiência vive essa condição de maneira única e precisa ser atendido a partir dessa unicidade, a fim de exercer em plenitude seus direitos básicos”.
Manifestação da CNPEEI – Comissão Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva
O Diário PcD teve acesso a nota técnica oficial da CNPEEI sobre a tramitação do projeto e as consequências para as pessoas com deficiência.
Confira a íntegra:
A Comissão Nacional da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (CNPEEI), composta por membros do Ministério da Educação e de diversas entidades da sociedade civil de defesa dos direitos das pessoas com deficiência RESOLVE apresentar Nota Técnica relativa ao Substitutivo ao Projeto de Lei 3035, de 2020 (apensados os : PL nº 5.093, de 2020, PL nº 2.917, de 2021, PL nº 3.958, de 2021, PL nº 730, de 2022, PL nº 1.434, de 2022, PL nº 2.418, de 2022, PL nº 695, de 2023, PL nº 858, de 2023, PL nº 863, DE 2023, PL nº 1.178, de 2023, nº 1.620, de 2023, nº 1.847, de 2023, nº 2.425, de 2023, e nº 2.472, de 2023) em trâmite na Câmara dos Deputados em regime de urgência:
Considerando que a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), que tem status de emenda constitucional já que aprovada nos termos do procedimento do art. 5.º, parágrafo 3.º da Constituição Federal, adota o modelo social de deficiência, considerando “pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual,
em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”, conceito também reproduzido pela Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência;
Considerando os artigos 4 e 24 da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) e o art. 27 da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI; Lei 13.146/15) que garantem a educação inclusiva em todos os níveis;
Considerando que o público-alvo da educação especial (PAEE) pelo Decreto 7611/11, que dispõe sobre atendimento educacional especializado, são as pessoas com deficiência, com transtornos globais do desenvolvimento e com altas habilidades ou superdotação (art. 1.º, parágrafo 1.º);
Considerando que, conforme o art. 24, parágrafo 2.º, da CDPD, para realização deste direito são garantidas medidas de apoio com vistas à inclusão e que as medidas de apoio individualizadas devem ser adotadas em ambientes que maximizem o desenvolvimento acadêmico e social, de acordo com a meta de inclusão plena;
Considerando que o referido projeto determina que seja permitida a atuação de um Acompanhante Terapêutico (AT) no ambiente escolar, sem haver vinculação funcional com o corpo pedagógico, suscitando, ademais, toda sorte de problemas estruturais, nomeadamente: (i) intervenção terapêutica no ambiente escolar; (ii) atuação de profissional estranho e desvinculado dos objetivos pedagógicos e não subordinado à gestão pedagógica; (iii) direcionamento de política pública para uma metodologia
terapêutica questionável;
Considerando a vedação de cobrança de valores pelos apoios oferecidos na escola conforme art. 28, parágrafo 1.º, da LBI, sendo que os apoios devem ser garantidos tanto na escola pública quanto na escola particular, conforme inclusive decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF) na ADI 5357, sendo crime a cobrança de valores extras (art. 8.º, caput, da Lei 7853/89 com redação da LBI), dado que essa medida aprofundaria as desigualdades sociais na medida em que se transferem para a famílias as responsabilidades que cabem ao Estado de garantir as condições materiais para a inclusão de estudantes com deficiência;
Considerando a inexistência de acompanhante terapêutico no Sistema Único de Saúde (SUS) para apoio nas escolas públicas e considerando que uma política intersetorial entre educação e saúde deve se pautar na inclusão dos alunos e não na exclusão dentro da sala de aula;
Considerando ainda que o espaço escolar deve privilegiar o concurso de saberes e recursos pedagógicos, ainda que em articulação com outras políticas e campos de conhecimento, mas sem interferências indevidas;
Considerando que no autismo há um grande lobby de grupos ligados à Applied Behavior Analysis (ABA), ou Análise do Comportamento Aplicada, que é uma abordagem terapêutica que se concentra na análise e modificação dos comportamentos humanos, que se colocam uma abordagem científica, mas que tem
sido eticamente questionada por pessoas autistas que foram a ela submetidas;
Considerando ainda, de acordo com nota técnica nº4/2014 do MEC, não se pode exigir a apresentação de laudo médico (diagnóstico clínico) por parte do aluno com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento ou altas habilidades/superdotação, para atendimento pedagógico e não clínico. A sexigência de diagnóstico clínico dos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento, altas habilidades/superdotação denotaria imposição de barreiras ao seu acesso aos
sistemas de ensino, configurando-se em discriminação e cerceamento de direito;
Considerando que a LBI prevê uma avaliação biopsicossocial da deficiência (art. 2.º, parágrafo 1.º) e que o Ministério de Cidadania e Direitos Humanos criou um grupo de trabalho para realizar o aperfeiçoamento do índice de funcionalidade brasileiro modificado (IFBr-M) e que a avaliação contribuirá para acesso a diversas políticas públicas, inclusive de educação, não cabendo, portanto, a avaliação a partir de um
modelo médico;
Considerando que o texto em análise sugere ingerência sobre a organização da Assistência Social, regulada pela Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, posto que o PL propõe de maneira descontextualizada e desarticulada à PNAS e ao trabalho desenvolvido pelo Ministério de Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome a alteração dos Serviços de Fortalecimento de Vínculos;
Considerando a Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva adotada pelo Brasil a partir de 2008;
Considerando, ainda, a revogação do Decreto 10.502/2020, assinada pelo presidente Lula no dia 1º de janeiro de 2023, subscrevendo as lutas dos movimentos sociais pelos direitos das pessoas com deficiência e pela defesa da escola para todas as pessoas, o que sinalizou a direção incontornável dos esforços e dos investimentos públicos para a consolidação da Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva, que sofre, desde 2016, com a precarização das condições de trabalho nas escolas decorrente da falta de investimentos de toda ordem por parte do poder público;
Considerando, sobretudo, que não houve participação e debate social na formulação do PL 3035, e demais projetos apensados, o que fere um direito constitucional descrito no artigo 4 do Decreto 6949/2009:
Art. 4. […]
- Na elaboração e implementação de legislação e políticas para aplicar a presente Convenção e em outros processos de tomada de decisão relativos às pessoas com deficiência, os Estados Partes realizarão consultas estreitas e envolverão ativamente pessoas com deficiência, inclusive crianças com deficiência, por intermédio de suas organizações representativas
Além disso, o art. 29.1b da Convenção prevê que os Estados Partes promovam “ativamente um ambiente em que as pessoas com deficiência possam participar efetiva e plenamente na condução das questões públicas, sem discriminação e em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, e encorajar sua participação nas questões públicas”. Daí extrai-se o lema “nada sobre nós sem nós
Diante do exposto, a CNEEPEI se manifesta veemente contrária ao PL 3035/2020 e demais textos substitutivos, entendendo sua inconstitucionalidade tanto na propositura, cujo caráter de urgência e o encaminhamento feriram os princípios democráticos e os direitos das pessoas com deficiência à participação social, quanto no conteúdo, em flagrante desacordo com os princípios constitucionais que regem a educação brasileira, ao admitir o fomento à segregação de estudantes com deficiência e demais condições do neurodesenvolvimento.
Diante disso, esta Comissão solicita o arquivamento do referido projeto de lei.
Subscrevem esta nota as instituições que compõem a Comissão Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva:
- Associação Brasileira para Ação por Direitos das Pessoas Autistas (ABRAÇA)
- Associação Brasileira de Pesquisa em Educação Especial (ABPEE)
- Associação Múltiplos pela Esclerose (AME)
- Associação Nacional de Defensoras e Defensores Públicos – ANADEP
- Associação Nacional em Financiamento da Educação (FINEDUCA)
- Associação Nacional dos Membros do Ministério Público de Defesa do Direito
de Pessoas Idosas e Pessoas com Deficiência (AMPID) - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED)
- Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional (ABRAPEE)
- Associação Nacional dos Surdos Oralizados (ANASO)
- Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT)
- Conselho Brasileiro para Superdotação (CONBRASD)
- Conselho Nacional dos Secretários de Educação – CONSED
- Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down (FBASD)
- Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos (FENEIS)
- Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)
- Instituto Cáue
- Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP)
- Instituto Rodrigo Mendes
- Organização Nacional de Cegos do Brasil (ONCB)
- Secretaria de Educação Básica (SEB)
- Secretaria de Educação Intersetorial e com os Sistemas de Ensino (SASE)
- Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC)
- Secretaria de Educação Superior (SESU)
- União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (UNCME)
- União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME)
Parlamentar disponibiliza parecer favorável a aprovação do Projeto
Nesta quarta-feira, 23, o Deputado Federal Duarte Junior/PSB-MA divulgou o PARECER DE PLENÁRIO PELA(S) COMISSÃO(ÕES) DE DEFESA DOS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA, DE
EDUCAÇÃO, DE FINANÇAS E TRIBUTAÇÃO, DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA E DE CIDADANIA AO PROJETO DE LEI Nº 3.035, DE 2020.
Em seu PARECER ele pede pela aprovação do PL 3035/2020.
Confira a íntegra do parecer:
Confira a transmissão pelo Canal do Diário PcD no YouTube
Fonte: Agência Câmara de Notícias