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  • qui. nov 21st, 2024
Epilepsia: doença ou sintoma?

De acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 13 milhões de brasileiros convivem com uma das mais de 8 mil doenças raras descritas.[1] Em geral, elas são crônicas, degenerativas e podem levar à morte precoce pela falta de informação e dificuldade de acesso a profissionais especializados. “A jornada do paciente raro até o diagnóstico invariavelmente é bastante árdua e pode durar até 15 anos. Isso porque a maioria apresenta sintomas que podem levar os profissionais de saúde a conclusões equivocadas, quando não investigadas adequadamente”, relata a neurologista pediátrica do Hospital Pequeno Príncipe, Mara Lúcia Schimitz Ferreira Santos.

A epilepsia, por exemplo, é um distúrbio neurológico do sistema nervoso central, especificamente do cérebro, que pode complicar a definição de diagnósticos. Por definição, epilepsia é uma doença cerebral caracterizada por uma tendência a ter convulsões recorrentes[2,3]. Isto é, pelo menos duas crises epilépticas não provocadas ou duas crises reflexas ocorrendo com um intervalo mínimo de 24 horas; uma crise epiléptica ou uma crise reflexa e risco de uma nova crise estimado em pelo menos 60%; ou diagnóstico de uma síndrome epiléptica[4]. A crise em si, acontece quando há uma descarga elétrica excessiva repentina que interrompe a atividade normal das células nervosas. De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), a doença afeta cerca de 50 milhões de pessoas em todo o mundo[5].

Mais da metade de todas as epilepsias têm alguma base genética[6]. As síndromes nas quais a epilepsia é um aspecto importante do quadro clínico podem ser provocadas por genes envolvidos em diferentes vias celulares, tais como: migração neuronal, metabolismo de glicogênio e cadeia respiratória. Portanto, acredita-se que diferentes categorias de genes possam atuar na determinação do traço epiléptico[7].

Ao mesmo tempo, esse tipo de manifestação pode ser indicativo de uma outra gama muito ampla de doenças, principalmente raras, como a Lipofuscinose Ceroide Neuronal do tipo 2 (CLN2). Também conhecida como Doença de Batten, é neurodegenerativa, hereditária, ultrarrara, se manifesta ainda na infância e faz com que o organismo do paciente seja incapaz de produzir as proteínas necessárias para o metabolismo de moléculas cerebrais[8]. Mara Lúcia alerta que “muitos pacientes acabam recebendo o diagnóstico de epilepsia, mas há cuidados específicos para esta condição genética”.

Como resultado, os neurônios sofrem danos progressivos, levando ao desenvolvimento de outros diferentes sintomas, já nos primeiros meses de vida da criança, e que vão alterando de acordo com cada faixa etária, por exemplo, alterações comportamentais, dificuldades de aprendizado e perda de habilidades motoras[9].

O diagnóstico de CLN2 pode ser confirmado por meio de exames que permitem a realização da análise genética e da enzima deficiente. Os testes podem ser realizados em pacientes com suspeita clínica ou mesmo com quadro de epilepsia, quando não há uma causa evidente. “Apesar de não ter cura, diagnóstico precoce é crucial para garantir que os pacientes possam se beneficiar do tratamento multidisciplinar e medicamentoso adequado, que é a chave para amenizar os sintomas como a epilepsia, desacelerar a progressão da doença e, consequentemente, melhorar a qualidade de vida”, esclarece a neurologista.

“A Doença de Batten é devastadora não somente para a criança, mas também para seus familiares, cuidadores e todo seu ciclo social. Se não diagnosticada e tratada adequadamente, pode causar danos cerebrais irreversíveis”, finaliza Mara Lúcia.


[1] Link. Acessado em junho de 2023
[2] Kwan P et al. (2010) Definição de epilepsia resistente a medicamentos: proposta de consenso pela Força-Tarefa ad hoc da Comissão de Estratégias Terapêuticas da ILAE. Epilepsia 51:1069-1077. Link
[3] Wiebe S et al. (2001) Um estudo randomizado e controlado de cirurgia para epilepsia do lobo temporal. N Engl J Med 345:311-381. Link
[4] Liberalesso PBN. Síndromes epilépticas na infância. Uma abordagem prática. Resid Pediatr. 2018;8(0 Supl .1): 56-63 DOI: 10.25060/residpediatr-2018.v8s1-10
[5] Link. Acessado em junho de 2023
[6] Pal, D. K. et al. Nat. Rev. Neurol. 6, 445–453 (2010); published online 20 July 2010; doi:10.1038/nrneurol.2010.92
[7] GITAÍ, D. L. G. et al.. Genes e epilepsia I: epilepsia e alterações genéticas. Revista da Associação Médica Brasileira, v. 54, n. 3, p. 272–278, maio 2008.
[8] Williams, R.E, Adams, H. R, Blohm, M. Management Strategies for CLN2 Disease. Pediatric Neurology. Disponível em: Link
[9] Claussen M, Heim P, Knispel J, Goebel HH, Kohlschütter A. Incidence of neuronal ceroid-lipofuscinoses in West Germany: variation of a method for studying autosomal recessive disorders. American Journal of Medical Genetics. Disponível em: Link

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