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Para Rede-In, matéria do Fantástico “está equivocada e desalinhada à  Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU”

ByJornalismo Diário PcD

set 16, 2023
Para Rede-In, matéria do Fantástico "está equivocada e desalinhada à  Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU"

A Rede-In – Rede Brasileira de Inclusão, entidade fundada em 2018 e que congrega 14 associações e movimentos de âmbito nacional que trabalham pela implementação de uma sociedade inclusiva no Brasil divulgou uma Nota que foi encaminhada ao Fantástico, da Rede Globo, em função de matéria apresentada no domingo, 10, sobre as investigações em andamento de “situação análoga à escravidão” de Sônia Maria de Jesus, que por décadas esteve na casa da família de um desembargador de justiça catarinense. A mulher é surda e nunca teve acesso à educação e desconhecia Libras.

Em trechos da nota a Rede afirma que:

  1. Que reconfigure, já no próximo domingo, a abordagem dada à matéria sobre a senhora Sônia Maria de Jesus, mulher negra e com deficiência auditiva, resgatada em junho passado da casa de um desembargador em Florianópolis (SC), sob a suspeita, segundo as polícias Civil e Federal, a auditoria fiscal do Ministério do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho, de escravidão ou situação análoga à escravidão.
  • Independentemente das decisões do STJ e do STF ainda em curso ( o caso será analisado  pelo Plenário do STF,) trata-se de uma história sistemática de violação de direitos humanos que merece mais atenção do programa Fantástico. É uma situação emblemática de violação dos direitos da infância, do direito ao trabalho, do direito à educação, do direito à comunicação e à liberdade de expressão,  e da prática (terrível) do trabalho escravo no Brasil, entre outros temas de direitos humanos.
  • A justificativa da Rede-In para esta nota é que o programa Fantástico não ofereceu, no domingo passado, dia 10 de setembro, um trabalho jornalístico coerente com a gravidade do tema ao ignorar o contraditório do assunto, favorecendo apenas, ao término da matéria, o parecer do STJ e do STF, de modo a dar como encerrada a questão, e ignorando os fatos identificados pela Auditoria Fiscal do Ministério do Trabalho, pelo  Ministério Público do Trabalho e pela Defensoria Pública da União que registraram terem resgatado Sônia Maria de Jesus de uma situação análoga à escravidão na residência da família do desembargador Jorge Luíz de Borba. 
  • A Rede-In acredita que a autorização de recondução da vítima para a casa onde foi supostamente escravizada, por conta de  uma decisão do STJ, confirmada pelo Ministro do STF, André Mendonça, viola frontalmente os direitos humanos da senhora Sônia Maria de Jesus. 
  • É justamente por se tratar de tema de direitos humanos, e de interesse público, que a Rede-In aqui se manifesta. A abordagem da matéria do Fantástico está equivocada e desalinhada à  Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU, que integra a Constituição Federal, à Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência e ao Estatuto da Criança e do Adolescente, uma vez que o direito indisponível à educação foi negado a senhora Sônia desde quando passou a integrar a “família” do desembargador, ainda criança. Tal atitude inicial do desembargador já é, por si só, inconstitucional, agravada pelo fato de Sônia Maria de Jesus não ter tido acesso também ao conhecimento da Libras, por ser pessoa surda ou com deficiência auditiva.
  • Ante os fatos e os argumentos expendidos pelos órgãos que estão acompanhando o caso, reiteramos nosso pedido para que o programa Fantástico retome o tema e se reposicione, lendo esta nota de realinhamento, principalmente em face das falas finais da matéria, que conduzem a sociedade brasileira a um entendimento equivocado sobre o direito ao trabalho, o direito à vida e à capacidade jurídica de uma pessoa com deficiência que não teve acesso a uma língua ou forma de comunicação alternativa que lhe permitisse expressar suas vontades.

Os signatários da Rede-In ainda afirmam que:

  1. Se Sônia Maria de Jesus não se utiliza de nenhuma língua e se comunica apenas por sons que não se configuram como comunicação explícita, segundo os textos aos quais tivemos acesso pelos meios de comunicação e, mais, se por única responsabilidade do desembargador e de sua família, não teve acesso à educação e a formas de comunicação, como a Libras, ou a língua portuguesa, durante as quatro décadas em que viveu na sua casa, como saber se ela decidiu realmente voltar para a casa onde era supostamente escravizada, ainda que esta seja a única realidade que conheceu na vida até recentemente? Quem pode garantir que concordou em voltar? O próprio desembargador? O correto seria, inicialmente, suspender o processo a fim de garantir à  Sônia de Jesus o tempo necessário para que ela possa  continuar desenvolvendo  uma forma de comunicação e subsequentemente manifestar sua concordância ou discordância em relação ao retorno à casa da família do desembargador e em relação também a outras questões. Enquanto isso, Sonia de Jesus deveria ficar no local de acolhimento, com aulas específicas para suprir suas necessidades de educação e comunicação – nunca atendidas pela família do desembargador. O processo de aprendizagem de uma língua  já estava acontecendo, com o acompanhamento da  Defensoria Pública.
  • As referidas decisões do STJ e do STF, ao ignorarem a trágica situação de degradação da dignidade da senhora Sônia Maria de Jesus, a qual foi submetida por quatro décadas, afrontam os princípios e preceitos da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que integra a Constituição Federal, e a Lei Brasileira de Inclusão e, ainda, o Estatuto da Criança e do Adolescente e não devem ser ignorada pelo Fantástico. 
  • A Rede-In solicita ao Fantástico que reveja sua abordagem e dê prosseguimento à  matéria, expandindo suas fontes e abrindo o contraditório, entrevistando ministros do governo federal, a exemplo do Ministro de Direitos Humanos e Cidadania, auditores fiscais que participaram do resgate e membros do Ministério Público do Trabalho, bem como organizações da  sociedade civil especializadas no tema, como a AMPID e outras.

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