OPINIÃO
- * Por Flávia Marçal e Lucelmo Lacerda
A cada 36 crianças, uma é diagnosticada com autismo. E a garantia do direito à educação desses estudantes se apresenta como tema de interesse público nacional.
Os dados são de prevalência do autismo nos Estados Unidos, de 2023. No Brasil, estima-se que 5.95 milhões de pessoas tenham esta condição, com percentil significativo em idade escolar.
No que tange ao atendimento educacional desses alunos, o Conselho Nacional de Educação – CNE vem desempenhando um papel capital, como órgão normativo, ao estabelecer diretrizes e orientações para os sistemas.
O CNE aprovou recentemente, e por unanimidade, o Relatório Técnico “NORTEAR: Orientações para o Atendimento Educacional ao Estudante com Transtorno do Espectro Autista – TEA”. Em uma construção colaborativa, os relatores que atuaram (dentre os quais estão os autores deste texto) de forma voluntária, contribuindo com suas expertises, puderam dialogar e apresentar caminhos a partir da formação de amplo um grupo de trabalho.
Com a perspectiva de direito habilitante, o Relatório partiu de três pontos: os documentos legais sobre o tema; o conhecimento científico como base das propostas; e a construção do processo educacional para o alcance de uma sociedade mais equânime e inclusiva.
Partindo da concepção do direito humano à educação inclusiva, o documento passa por questões como matrícula, importância do projeto político pedagógico e a participação das famílias e das pessoas com autismo. Também foram considerados temas essenciais como a interseccionalidade em tópicos como gênero, raça, localização geográfica e demais fatores que podem alterar a realidade desses alunos.
O trabalho destaca a garantia de uma educação que salvaguarde a primeira infância como prioridade absoluta, não somente por uma garantia constitucional, mas pelo impacto que o desenvolvimento de programas educacionais, pautados no desenvolvimento infantil, para crianças em situação de risco para o autismo, podem trazer para sua autonomia.
Assim, tratar planejamento educacional voltado a estudantes com autismo tendo como referência o desenho universal e as adaptações razoáveis e, nesse contexto, o papel do professor de regência em sala de aula, do professor do atendimento educacional especializado e do acompanhante especializado é crucial.
Para tanto, o documento destaca a importância dos documentos do PEI e PAEE, transcorrendo pela imperiosa necessidade de que os sistemas educacionais adotem Protocolos de Conduta para salvaguardar a proteção desse público-alvo.
Que os esforços da construção coletiva deste trabalho em sistemas desafiadores – quer seja pelas dimensões continentais do país e pelas profundas desigualdades que ainda o marcam, quer seja pela invisibilidade que estudantes com autismo tiveram historicamente – possa fomentar o diálogo, a edificação conjunta e a certeza inabalável de que todos podemos e devemos contribuir para uma sociedade mais justa e igualitária: afinal, se não agora, quando?
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Lucelmo Lacerda é doutor em Educação, com Pós-doutorado em Psicologia e pesquisador de Autismo e Inclusão, autor do livro “Crítica à Pseudociência em Educação Especial – Trilhas de uma educação inclusiva baseada em evidências”.
Flávia Marçal é advogada, doutora em Sociologia, professora da Universidade Federal Rural da Amazônia e gestora do Grupo Mundo Azul.