No Dia Internacional da Mulher, celebrado em 8 de março, é fundamental destacarmos não apenas as conquistas das mulheres, mas também refletirmos sobre as barreiras e desafios frequentes que elas ainda enfrentam, especialmente aquelas que têm deficiência. Para o Defensor Público Federal André Naves, especialista em Direitos Humanos e Inclusão, é preciso trazer à discussão a rotina difícil que ainda faz parte da vida de muitas dessas mulheres, principalmente das mais pobres. Naves lembra, por exemplo, que mulheres com deficiência são duplamente discriminadas no mercado de trabalho – por serem mulheres e por terem alguma deficiência. Isso significa sofrer com a invisibilidade e muito mais discriminação no trabalho.
A Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência reconhece: “mulheres e meninas com deficiência estão sujeitas a múltiplas formas de discriminação”. Mulheres PcDs sofrem discriminação de gênero e de capacidade, o que as torna mais vulneráveis a uma série de situações penosas, incluindo questões relacionadas aos direitos humanos, violência, saúde, sexualidade, educação e trabalho.
André Naves lembra que a violência marca o cotidiano de muitas mulheres desse grupo, de forma agressiva e direta, seja por meio da violência física, sexual ou pela violência psicológica. “Mulheres com deficiência são mais propensas a ter baixa autoestima e, em consequência, a manter relacionamentos abusivos. É urgente que tenhamos políticas públicas mais efetivas para o combate ao capacitismo, contemplando a proteção e os direitos dessas meninas e mulheres”, pontua o Defensor, que acrescenta: “Fazemos parte de uma sociedade capacitista, que discrimina os PcD´s em geral, mas muito as mulheres com deficiência do que os homens. De acordo com o imaginário da sociedade, o homem PcD, em geral, pode ser cuidado por uma mulher sem deficiência. Já a mulher PcD não pode se relacionar afetivamente, ter um trabalho e cuidar da casa porque não tem capacidade de cuidar de si mesma e de ter uma profissão”, frisa.
Nesta data, devemos destacar também o cotidiano atribulado das mães que têm filhos com deficiência. Conhecidas como mães atípicas, elas denunciam a sobrecarga de trabalho e a falta de redes de apoio psicológico e financeiro, o que pode acarretar, em muitas delas, estresse físico e mental.
Exemplo de preconceito em dobro é o vivido por Maria Alexandra Giorgio Natali, de 40 anos. Mulher preta que tem paralisia cerebral (com idade mental de 5 anos), é filha adotiva da jornalista Nydia Giorgio Natali, de 69 anos. Nydia conta que o preconceito começou cedo, em sua própria casa. A tia chamava Alexandra de negrinha e não queria a aproximação da menina. “Maria Alexandra nunca aprendeu a ler e escrever, mas vive com caderno e lápis na mão fingindo que escreve. Na realidade, ela nunca sentiu o preconceito diretamente e é feliz. Sempre fiz de tudo para que minha filha não soubesse o que é preconceito de verdade, apesar de lidarmos com isso diariamente”, ressaltou Nydia.
Mas há também boas notícias. Na contramão das dificuldades, há exemplos de sucesso entre mulheres PcDs, como o da modelo e influenciadora Maju, que é uma entre as 300 mil pessoas com Síndrome de Down no Brasil e a primeira a desfilar nas passarelas da Brasil Fashion Week. Com apenas 23 anos, já possui um vasto currículo – com trabalhos na São Paulo Fashion Week e L’Oréal Paris, mostrando que não há barreiras para pessoas com deficiência quando passamos por cima do preconceito.
Outro bom exemplo é o da atriz, autora teatral, influente digital, ativista e palestrante Tathi Piancastelli, que já foi, inclusive, homenageada com a personagem Tati, da Turma da Mônica. Ela iniciou sua carreira nas artes cênicas em Campinas (SP), atuando em várias peças, entre elas o musical Grease. Percebendo seu talento, a família a incentivou a seguir em frente. Ao se mudar para os EUA, Tathi se encantou com a Broadway e decidiu escrever sua própria peça. Não só escreveu, como atuou como personagem principal em ‘Menina dos Meus Olhos’. A peça conta a história da adolescente Bela, que busca o amor e a aceitação social. Tornou-se, assim, a primeira autora com Síndrome de Down a escrever e atuar numa peça.
“É fundamental reconhecermos as lutas das mulheres PcDs e trabalharmos para superar as barreiras que as impedem de alcançar seu pleno potencial. Isso requer um compromisso renovado do poder público, dos legisladores e de toda a sociedade para promover a inclusão e a igualdade em todos os aspectos da vida”, finaliza o Defensor Público.