Espaço na CasaCor homenageia a história e a coragem de uma jovem deficiente visual. Totalmente voltado para a acessibilidade, o projeto faz parte da 32ª edição da mostra em Brasília
O lar, aquele ambiente de descanso, também deve proporcionar acessibilidade aos indivíduos que necessitam de alguma atenção especial. Por isso, é extremamente importante criar um projeto que seja confortável, seguro e aconchegante para pessoas com deficiência (PcD).
Pensando nisso, o arquiteto Glauter Suassuna decidiu inaugurar um espaço inovador na 32ª edição da CasaCor Brasília. Este ano, o evento traz a importância de resgatar as raízes e deixar um legado para as próximas gerações. Com isso, o profissional optou por fazer uma homenagem especial. A inspiração é a jovem Isadora Almeida, 19 anos, que nasceu com glaucoma e catarata congênita.
Embora tenha feito várias cirurgias, cresceu como uma criança de baixa visão. “Aos 8 anos, voando de João Pessoa para Brasília, com uma mudança de pressão de cabine, ela evoluiu com descolamento de retina bilateral simultâneo. Mesmo com mais um procedimento, não teve sucesso”, conta Glauter. A partir daí, a vida de Isadora mudou completamente. Hoje, seus olhos são atróficos e insensíveis à luz.
Depois de viver um longo período com uma espécie de luto, decidiu que não queria mais sofrer. Apesar das condições difíceis, acumulou inúmeras experiências, como pular de paraquedas, praticar judô (ela é faixa preta) e, até ,fazer rapel em cachoeira. A jovem toca piano, estuda direito e carrega o sonho de se tornar juíza. Diante de tanta força, Glauter resolveu criar o espaço Olhar de Isadora por Espectro Oftalmologia, na CasaCor.
“Sempre fui uma pessoa que buscou um propósito para fazer diferença na vida das pessoas. Nesse projeto, em particular, encontrei um propósito relacionado à inclusão dos deficientes visuais. Um trabalho baseado na força de vida e de superação da Isadora, que é um exemplo de esperança para todos”, detalha. Ao conhecer Isadora, em 2023, o arquiteto destaca que era necessário desenvolver um ambiente que estivesse ausente de barreiras arquitetônicas e que facilitassem o dia a dia da jovem.
Processo de criação
Com isso, Glauter buscou conhecimento sobre arquitetura e deficientes visuais. Encontrou pouco sobre o tema e saiu para descobrir novos lugares. “Fui ao Ceedv (Centro de Ensino Especial para Deficientes Visuais) estudar a disciplina de atividades de vida autônoma, em que os cegos aprendem o que fazer no ambiente doméstico, como usar o banheiro, arrumar a cama, escolher as roupas no guarda-roupa, passar roupa, cozinhar, etc. Ali entendi os desafios de cada um”, relembra.
Lá, notou que o maior medo era o de se ferirem com vidro ou fogo. Além disso, soube da incapacidade em escolher a climatização ideal para o ambiente, ligar o micro-ondas, entre outras dificuldades. Assim, fez-se necessária a realização de várias adaptações domésticas durante a produção de ideias. Sempre na companhia de Isadora, que o guiou na maioria das escolhas, confeccionou um ambiente adaptado e cheio de amor.
Algumas das soluções encontradas pelo arquiteto foram móveis orgânicos que, sem curvas, ajudam a evitar traumas; rodapé iluminado, pois facilitam a identificação de paredes e obstáculos para pessoas com baixa visão; acionamento de luzes e eletrodomésticos por automação; torneiras com temporizador; cama com apoio ao chão e retroiluminação; uso de texturas diferentes, para que o deficiente visual consiga desfrutar dos ambientes da casa; e espaços mais abertos, com menos paredes e obstáculos, conjugando os ambientes do lar.
Usou, ainda, materiais variados relacionados ao piso, com o intuito de que Isadora saiba identificar os diferentes ambientes e a transição deles no passeio pela casa. “Escolhi fogões com sistema corta-fogo e fogão de indução com comando de voz, pois a maioria é digital e não tem pintura em relevo. Panelas e acessórios de cozinha de aço cirúrgico que não aquece por fora e têm alças de silicone, pois permitem receitas sem óleo e aproveitam a água da própria carne e com tempo de cozimento preciso.”
Sendo assim, o deficiente visual pode cronometrar o tempo em que a panela ficará ligada, acionar e desligar o forno de indução por comando de voz. “São recursos que não demandam visualizar a comida durante o cozimento, mas apenas no final do processo. O cego também poderia se beneficiar de panelas elétricas”, completa Glauter. Para o arquiteto, desenvolver projetos como esse é investir na autonomia individual do ser humano. Mais que isso, pensar em soluções que causem menos sofrimento ao deficiente visual.
Um olhar especial
De acordo com o arquiteto Diego Aquino, uma casa adaptada é um ambiente projetado para atender às necessidades específicas dos moradores, especialmente aqueles com alguma deficiência ou mobilidade reduzida. O conceito vai além da simples acessibilidade, proporcionando soluções que tornam o espaço funcional e seguro. Exemplos incluem bancadas mais baixas para cadeirantes, portas com vãos mais amplos para facilitar a passagem, e barras de apoio em banheiros e quartos para idosos”, afirma.
Para garantir que projetos assim sejam feitos da melhor maneira, Diego recomenda a procura por um arquiteto experiente, que poderá criar um projeto não só esteticamente agradável, mas funcional e adaptado às necessidades específicas da pessoa com deficiência. “Um bom profissional considerará todas as particularidades e criará um espaço que seja confortável, acessível e seguro, proporcionando uma melhor qualidade de vida para todos”, finaliza.
Outras mudanças
- Paredes pintadas com cores vivas e fortes, alto contraste na pia da cozinha, escolhendo granito branco para contrastar com cuba e fornos pretos;
- Cristaleira sem vidro, com portas de corda náutica (evita acidente com vidro e facilita a limpeza e a manutenção);
- Vaso sanitário com sistemas de lavagem automatizado diferentes para a auto higiene;
- Controle de automação para o acionamento de luzes, ar condicionado, e spa;
- Dentro do closet ter uma coleção de camisas de cores diferentes com um sistema de linguagem criada pela See colors para indicar cores (sistema em relevo);
- Mudança de cabides também para que diferencie as cores, pois poucas empresas fazem uso de braile ou outro recurso para essa inclusão;
- Metais de cozinha e banheiro com recursos de alavancas.
Programe-se
A 32ª edição da CasaCor Brasília ocorre pela terceira vez consecutiva na BRB Mané Garrincha. A mostra terá encerramento em 16 de outubro. O funcionamento do espaço é de terça a domingo e oferece acessibilidade total, incluindo para portadores de deficiência visual e auditiva.
Prêmio 2024
O Correio Braziliense e a CasaCor Brasília apresentam a 7ª edição do maior e mais prestigiado prêmio de decoração do Centro-Oeste. A partir do júri popular e do técnico, o Prêmio reconhece e divulga os melhores projetos de decoração, design e paisagismo. Em quatro categorias, a premiação destaca a criatividade e a inovação de profissionais das áreas. A votação estará aberta a partir de 30 de agosto no site: www.correiobraziliense.com.br/casacor2024.
Fonte: https://www.correiobraziliense.com.br