Representante dos médicos especialistas em diagnóstico desse tipo de câncer, a Sociedade Brasileira de Patologia (SBP) explica que a problemática está relacionada à falta de profissionais da área e à baixa remuneração para exames.
A Folha de S. Paulo publicou uma reportagem em que menciona que ao menos 87,4 mil casos de câncer de mama foram diagnosticados tardiamente no Brasil, de 2020, quando passou a vigorar a Lei nº 13.896/2019, até setembro de 2024. A chamada Lei dos 30 dias determina que pacientes com suspeita de câncer façam os exames necessários em até um mês.
De acordo com dados da Estimativa 2023 – Incidência de Câncer no Brasil do Instituto do Câncer (INCA), são estimados 74 mil novos casos de câncer de mama para cada ano do triênio 2023-2025. Porém, com o atraso no diagnóstico, o início do tratamento em até 60 dias, conforme estabelece a Lei nº 12.732/2012, fica comprometido.
Segundo dados do Ministério da Saúde analisados pelo Instituto Oncoguia, 58% das pessoas diagnosticadas com câncer no Sistema Único de Saúde (SUS) iniciam seus tratamentos já nos estágios avançados ou metastáticos, impedindo um prognóstico mais positivo.
Presidente da Sociedade Brasileira de Patologia (SBP), o Dr. Clóvis Klock detalha que tal gargalo se deve à carência de médicos patologistas no Brasil, especialmente no SUS. Dados da Demografia Médica 2023 da Associação Médica Brasileira (AMB) apontam que há 3.824 médicos patologistas no Brasil, o que representa apenas 0,8% de todos os especialistas. Comparativamente, existem 56.979 clínicos médicos (11,5%), 48.654 pediatras (9,8%) e 41.547 cirurgiões gerais (8,4%), áreas com mais profissionais.
Ou seja, a cada 100 médicos formados, mais ou menos um vai para a Patologia, ficando em torno de 40% das vagas oferecidas ociosas.
“Para combater essa tendência, é necessária uma política de incentivo por parte do governo. Uma estratégia seria colocar a Patologia como uma área prioritária, o que poderia incluir benefícios financeiros e educacionais. Além disso, estipular uma bolsa de residência mais atraente para os residentes poderia incentivar mais estudantes a seguirem essa especialidade”, exemplifica Klock.
O presidente da SBP acrescenta que a maioria dos profissionais possui uma carga horária limitada dedicada ao sistema público, o que dificulta o acesso e aumenta os tempos de espera para os resultados dos exames diagnósticos.
Baixa remuneração para exames – Outro fator relacionado ao gargalo é a irrisória remuneração paga pelos procedimentos diagnósticos em Patologia. Atualmente, apesar de o diagnóstico ter um valor elevado, o SUS paga uma quantia de apenas R$40,78 por exame.
Em 2019, o Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu uma auditoria que apontou o diagnóstico histopatológico como um dos principais gargalos na linha de cuidado oncológico. Desde então a problemática tem se estendido e a SBP, representante dos médicos especialistas em diagnóstico do câncer de mama e de outros tipos de tumor, tem atuado na busca de soluções com as autoridades.
“A tabela de valores praticada pelo SUS apresenta uma defasagem significativa, não refletindo os custos reais dos procedimentos e desestimulando a dedicação dos profissionais. Também não contempla procedimentos mais modernos, como testes moleculares que têm se tornado essenciais para uma abordagem mais efetiva dos casos”, complementa ele.
Tecnologia aliada à Patologia – Diante desse contexto, a SBP defende que a Patologia digital surge como uma ferramenta promissora para revolucionar a forma como os diagnósticos são realizados. O uso de tecnologias digitais, incluindo a digitalização de lâminas histológicas e o uso de Inteligência Artificial (IA), pode acelerar o tempo de resposta para o diagnóstico.
“Também, possibilita que centros de diagnóstico anátomo-patológico em diferentes regiões do País integrem suas operações, funcionando como centros de referência para locais onde há escassez de patologistas. Essa abordagem integrada facilitaria a redistribuição das demandas e contribuiria para a redução dos tempos de espera”, afirma Klock.
O Dr. Gerônimo Jr., secretário adjunto da SBP, participou em agosto de 2024 de uma reunião no Ministério da Saúde para discutir o tema: “Estamos desde 2016 alertando as autoridades e tivemos ainda mais argumentos com a auditoria do TCU. O Ministério da Saúde está sensível a essa problemática. Em breve, firmaremos um Termo de Cooperação Técnica para que nossa sociedade médica contribua com a solução dessa questão”, conclui.