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  • sex. nov 22nd, 2024

Inclusão de pessoas com deficiência exige conhecimento e reconhecimento social

Inclusão de pessoas com deficiência exige conhecimento e reconhecimento social

Especial, limitado, incapaz, inferior. Estas foram algumas das acepções que a palavra deficiente já recebeu. Os termos mudaram, a legislação evoluiu, mas o preconceito e a discriminação sobre a Pessoa Com Deficiência (PCD) continuam obstruindo o caminho delas rumo à inclusão. Como consequência, além dos impedimentos de natureza física, sensorial, mental ou intelectual que enfrentam, as pessoas com deficiência têm, ainda, que lidar com o estereótipo e o capacitismo. Baseado na ideia de que a deficiência é apenas parte da condição e da identidade da pessoa, o movimento anticapacitista vem buscando engajar mais adeptos para mostrar que é a falta de acessibilidade que impede uma transformação social que alcance a todos. 

“Em outras minorias, em outros grupos sociais, nós conseguimos avançar. Mas a questão da deficiência ainda é um tabu. Não temos representatividade nas comissões de acolhimento”, afirma Juliana Altino, estudante de pedagogia na Faculdade de Educação (FE) e fundadora do Coletivo PCD da USP, criado neste ano de 2023. Para ela, o coletivo tem a missão de levar conhecimento e reconhecimento dos desafios e realizações das pessoas com deficiência que convivem na Universidade. 

Atualmente, o Coletivo de Pessoas com Deficiência da USP já soma 48 integrantes, entre estudantes, servidores e apoiadores. O coletivo se organizou em grupos de trabalhos baseados nas principais demandas de seus integrantes, entre elas, questões jurídicas, sociais, esportivas e pedagógicas. A ideia é elaborar diretrizes e sugestões que possam servir de base para que os órgãos da Universidade construam políticas de educação e acessibilidade em suas instalações. Além de sugestões de baixo custo que podem ser incorporadas nas unidades para soluções rápidas e simples, o coletivo discute alternativas para incluir, ainda, familiares que frequentam o ambiente acadêmico. “Algumas pessoas têm dependência para coisas simples, como tomar banho. No primeiro semestre, minha mãe e irmã tiveram que se virar para comer, porque não podemos fazer duas bandejas”, relata Juliana sobre a rotina nos restaurantes universitários. O grupo se inspira no movimento feito pelas estudantes com filhos que moram no Conjunto Residencial, o Crusp. “No bloco das mães, há um espaço em que elas podem estar com a família. Existe uma lista especial para colocar dependentes das mães, mas por que não tem uma dessas para as pessoas com deficiência?”, questiona.

A aluna lembra que uma simples reforma de calçadas e adequação de rampas foram suficientes para que ela pudesse acessar o prédio da faculdade com segurança. O conserto beneficiou toda a comunidade, mas a ausência de acessibilidade pode afetar drasticamente a rotina de quem busca a mínima autonomia. “Em frente ao Metrô Butantã, uma das rampas que sai da avenida e dá acesso à estação era muito íngreme. Eu estava sozinha e a cadeira virou para trás. Eu caí e fiquei muito desesperada pois estava vindo um ônibus”, conta. Ela divide a rotina de estudos com a leitura de inúmeras normas e leis que definem as regras de acessibilidade física, social e educacional. “Só acho que eu não precisava ter aprendido tanto para ser tratada com o mínimo de respeito”, avalia. Juliana teve uma lesão medular causada pela mielite transversa, uma doença inflamatória de causa desconhecida que afeta os neurônios motores. 

“Essa doença me deixou com um negócio que eles chamam de paraparesia: eu tenho diminuição das forças nas pernas e diminuição também do sentido, só que eu lido com dores crônicas por causa disso. A sequela, na questão de andar, é uma das questões que me afetam. Depois que eu tive covid, as dores pioraram e eu precisei trancar a faculdade”, explica ao Jornal da USP

Após sua recuperação, a estudante voltou às aulas, mas precisou de adaptações em avaliações e até mesmo nas aulas, que eram dadas no segundo andar do prédio. Para acessá-lo, Juliana chegou a esperar que alguém fechasse a grade manual do elevador antigo para, só então, conseguir entrar. Em outro momento, o elevador passou um semestre inteiro quebrado. “Eles trocaram a minha sala [para o térreo], mas eu tive que fazer um pedido formal e apresentar um laudo. Então, no coletivo, uma reclamação recorrente é essa, de que na USP não somos só invisíveis; somos invalidados”, diz.

Juliana Altino – Foto: Arquivo pessoal

Juliana é uma das pessoas da comunidade USP que relataram ter alguma deficiência. Em abril de 2023, a Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) da USP lançou uma exposição baseada no primeiro grande estudo dedicado a avaliar as percepções de toda a comunidade universitária da USP. Em artigo para o Jornal da USP, a equipe responsável pelo tratamento dos dados informou que “os porcentuais que relataram não ter deficiências ou neurodiversidades foram 86,2% dos(as) estudantes de graduação, 89,8% dos(as) estudantes de pós-graduação, 92,6% dos(as) pós-doutorandos(as), 84,7% dos(as) servidores docentes e 82% dos(as) servidores(as) técnico-administrativos(as)”. O artigo também afirma que “deficiências físicas que afetam ou não a caminhada, lesão cerebral adquirida, deficiências de fala ou comunicação e transtorno do déficit de atenção com hiperatividade e outras foram citadas”, mas não informa as quantidades.

A divulgação informa que:

  • 5,2% de servidores, 5,9% de docentes e 3% de estudantes de graduação relataram ter deficiência visual total ou parcial;
  • 3,5% de servidores, 3,2% de docentes e 0,9% de estudantes de graduação relataram ter deficiência auditiva total ou parcial; 
  • 0,4% de servidores, 1,2% de docentes e 2,6% de estudantes de graduação relataram estar no espectro autista.

A reportagem apurou que 217 estudantes de graduação com matrícula ativa se autodeclararam PCD para a Pró-Reitoria de Graduação da USP. O Departamento de Recursos Humanos (RH) da USP informou que os sistemas corporativos de RH da USP não mantêm registros relativos ao número de servidores e docentes com algum tipo de deficiência. De acordo com o Escritório de Gestão de Indicadores de Desempenho Acadêmico (Egida) da Universidade, a partir de janeiro de 2024 deverão realizar uma coleta padronizada e sistematizada de dados junto à Superintendência de Tecnologia da Informação (STI). A ideia é que a USP possa desenvolver uma estratégia de captação de dados baseados na autodeclaração.

Fonte: https://jornal.usp.br/

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