Além da estética: conheça os desafios gerados pela fissura labiopalatina

Estudos mostram que, no mundo, a cada 3 minutos 1 bebê nasce com fissura labiopalatina. A fissura é uma anomalia craniofacial que afeta bruscamente a anatomia da boca e dificulta atividades simples da rotina, como falar, respirar e se alimentar

A fissura labiopalatina é um defeito congênito comum, resultado da malformação dos lábios e/ou céu da boca (palato) no período gestacional – no Brasil, 1 a cada 650 bebês nascidos são afetados. As causas da condição são desconhecidas, mas especialistas concordam que podem ser multifatoriais e incluir predisposição genética e exposições ambientais. Quando não tratadas, as fissuras labiopalatinas causam sérios problemas físicos e emocionais, o último, resultado do estigma enfrentado pelos pacientes.

Conhecida popularmente e erroneamente por “lábio leporino”, termo pejorativo associado à lebre e que deve cair em desuso, as fissuras labiopalatinas podem ser diagnosticadas durante a gravidez por um ultrassom de rotina ou após o nascimento do bebê. No entanto, certos tipos de fenda palatina só são diagnosticados de maneira tardia. “O exame clínico da mucosa bucal de recém-nascidos é de extrema importância. A fenda palatina submucosa, forma específica de fissura que é recoberta pela mucosa oral e nasal, por exemplo, é mais complexa de diagnosticar. No bebê o diagnóstico deve ser feito por exame físico, olhando-se sob a luz e realizando-se o toque no palato, mas muitas vezes este exame clínico inicial mais minucioso passa desapercebido e somente surge a suspeita quando a criança começa a falar e a voz se mostra “fanhosa”. Para esses casos, é necessário seguimento com avaliação periódica da percepção auditiva, e eventualmente a realização de exame endoscópico,” explica a médica Daniela Tanikawa, cirurgiã plástica e craniofacial, uma das maiores especialistas no assunto, que trabalha no Hospital Municipal Menino Jesus em São Paulo, entidade que conta com o apoio da Smile Train – maior organização do mundo dedicada à causa da fissura labiopalatina.

As fissuras também podem causar problemas dentários, além de infecções recorrentes de ouvido e perda auditiva. “A ausência do acompanhamento profissional adequado pode levar a sequelas irreversíveis, que afetam a deglutição, mastigação, respiração e fonação”, complementa a cirurgiã. Os sintomas físicos impactam também a saúde emocional, causados pelo estigma da fissura — os pacientes sentem-se envergonhados, socialmente excluídos e discriminados. Por muitas vezes, o bullying e o preconceito afetam o acesso ao tratamento, o rendimento escolar de crianças e, posteriormente, sua vida profissional.

“Passei minha vida toda recebendo aqueles olhares que dizem mais que mil palavras. Sofri bastante por não ter a aceitação dos meus colegas e demais crianças. Passei a esconder minhas cicatrizes da boca com maquiagem ainda adolescente. A autoaceitação veio apenas mais tarde, quando entendi que não havia nada de errado comigo. Percebi então que a melhor arma contra o estigma da fissura é a informação acessível e de qualidade”, conta Raíza Bernardo, maquiadora, modelo plus size e idealizadora do projeto Beleza fissurada.

O tratamento multidisciplinar, quando iniciado precocemente, permite que a criança tenha um melhor desenvolvimento e qualidade de vida. A cirurgia de reparação é o primeiro passo, recomendada ainda nos primeiros meses de vida. Além do resultado estético imediato, o reparo cirúrgico pode melhorar a respiração, a audição e o desenvolvimento da fala e da linguagem. Para complementar o tratamento, também é necessário o acompanhamento com diversos profissionais, entre eles fonoaudiólogos, dentistas, ortodontistas, psicoterapeutas e nutricionistas.

“O apoio familiar foi a base de tudo. Minha primeira cirurgia foi realizada aos oito meses de vida — ao todo, foram cinco procedimentos cirúrgicos realizados em paralelo com as consultas com ortodontistas, terapeutas e fonoaudiólogos. Hoje, com 26 anos, sigo em tratamento multidisciplinar e sei que não preciso de maquiagem para esconder quem eu sou. Meu objetivo profissional e de vida é fazer com que a causa seja conhecida, para que mais pessoas tenham acesso ao tratamento multidisciplinar e sejam acolhidas como eu fui. Quero ser a representatividade que tanto desejei ver ainda criança”, finaliza Raíza.

Compartilhe esta notícia:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Aviso de Direitos Autorais

Todos os direitos sobre os conteúdos publicados em todas as mídias sociais do Diário PcD, incluindo textos, imagens, gráficos, e qualquer outro material, estão reservados e são protegidos pelas leis de direitos autorais.
Todos os Direitos Reservados.
Nenhuma parte das publicações em todas as mídias sociais do Diário PcD devem ser reproduzidas, distribuídas, ou transmitidas de qualquer forma ou por qualquer meio, incluindo fotocópia, gravação, ou outros métodos eletrônicos ou mecânicos, sem a prévia autorização por escrito do titular dos direitos autorais, de acordo com a legislação vigente.
Para solicitações de permissão para usos diversos do material aqui apresentado, entre em contato por meio do e-mail jornalismopcd@gmail.com ou telefone 11.99699 9955.
A infração dos direitos autorais é uma violação de Lei Federal 9.610, passível de sanções civis e criminais.

Lorem ipsum dolor sit amet, consectetur adipiscing elit, sed do eiusmod tempor incididunt ut labore et dolore