Atlas da Violência 2025, divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em pareceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), aponta cenário de violência contra pessoas com deficiência
As estatísticas oficiais mostram que o Brasil registrou 45.747 homicídios em 2023, menor taxa em 11 anos. O país teve 21,2 registros em cada 100 mil habitantes, uma redução de 2,3% na comparação com 2022. Esses são os dados do Atlas da Violência 2025, divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em pareceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), nesta segunda-feira (12/05).
No recorte por Unidades Federativas (UFs), os menores indicadores de homicídios por 100 mil habitantes estão localizados nos estados do Sul, além de SP, DF e MG. Já as maiores taxas se concentram nas regiões Norte e Nordeste.
Vários fatores, potencialmente, explicam a redução geral da violência letal no Brasil, conforme já notado nas últimas edições do Atlas da Violência. Entre eles, a continuidade da transição demográfica rumo ao envelhecimento da população (que começou antes e com mais intensidade nos estados do Sudeste e Sul); trégua na rivalidade entre as duas maiores fações criminais; e uma verdadeira “revolução invisível” nas políticas de segurança pública locais, nas quais o planejamento, o foco no resultado, o uso da inteligência e as ações de prevenção social vêm substituindo a antiga política, baseada meramente no policiamento ostensivo. Com efeito, foram observadas reduções sistemáticas de homicídio há mais de 7 anos em 11 UFs.
Entre as pessoas com deficiência, as com deficiência intelectual apresentam as taxas de letalidade mais altas entre os quatro tipos de deficiência, com concentração acentuada nos estados de Goiás, Mato Grosso do Sul, Paraná, São Paulo, Santa Catarina e Espírito Santo. A notificação de violência contra pessoas com deficiência auditiva tem maior concentração no Centro-Oeste, Sul e Sudeste. A violência contra pessoas com deficiência física apresenta taxas particularmente elevadas na Região Sul e Sudeste. A deficiência visual tem as menores taxas absolutas entre os quatro tipos analisados.
As taxas são mais elevadas entre as mulheres em comparação aos homens, especialmente no caso da deficiência intelectual, em que o índice chega a 75,5 por 10 mil mulheres, contra 28,9 entre os homens. Essa diferença se repete nos demais tipos de deficiência: na deficiência física, as taxas são de 24,9 para mulheres e 10,3 para homens; na auditiva, 7,5 para mulheres e 3,3 para homens; e na visual, 2,2 para mulheres e 1,5 para homens.
Entre os tipos de violência contra a população com deficiência, a doméstica foi a mais frequente, totalizando 11.344 registros no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), seguida pela violência comunitária, com 4.831 ocorrências. O tipo misto contabilizou 3.221 notificações, enquanto a violência institucional registrou 617 casos.
VIOLÊNCIA CONTRA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA
Pessoas com deficiência estão mais suscetíveis à violência do que aquelas sem essa característica. Estudos indicam que esse grupo enfrenta taxas desproporcionalmente altas de vitimização, evidenciando a necessidade de abordagens específicas para sua proteção (Badakhshiyan, Naghavi e Jazayeri, 2024; Dammeyer e Chapman, 2018; Hughes et al., 2012; Jones et al., 2012). Fatores como dependência de terceiros para atividades cotidianas, isolamento social e estigma contribuem para essa vulnerabilidade. Além disso, os agressores costumam ser pessoas do convívio próximo, como familiares, parceiros ou amigos, o que torna a identificação e a denúncia dos casos ainda mais difíceis.
A violência contra pessoas com deficiência está intrinsicamente ligada a desigualdades sociais. Estima-se
que 16% da população mundial—cerca de 1,3 bilhão de pessoas em 2021—tenha algum tipo de deficiência, sendo esse grupo mais suscetível à pobreza e à exclusão social, fatores que ampliam os riscos de violência (OMS, 2022). A violência pode se manifestar de diferentes formas, incluindo agressão física, abuso sexual, violência emocional, negligência, exploração financeira, manipulação de medicação e até a destruição de equipamentos essenciais para a autonomia da pessoa com deficiência (Powers e Oschwald, 2004).
Entre crianças com deficiência, a vulnerabilidade é ainda maior. Uma revisão conduzida por Jones et al.,
(2012) revelou que elas têm quase quatro vezes mais probabilidade de serem vítimas de violência do que aquelas sem deficiência. Especificamente, o risco é 3,7 vezes maior para qualquer tipo de violência, 3,6 vezes maior para violência física e 2,9 vezes maior para violência sexual. Crianças com deficiências mentais ou intelectuais são as mais expostas, com um risco 4,6 vezes maior de sofrer violência sexual.
A situação também é alarmante entre adultos. Uma análise sistemática apontou que adultos com deficiên cia possuem um risco 1,5 vez maior de sofrer violência em comparação com a população sem deficiência. Para aqueles com transtornos de saúde mental, esse risco sobe para quase quatro vezes mais (Hughes et al., 2012).
Outro aspecto preocupante é a violência praticada por agentes do Estado, especialmente por forças policiais, contra pessoas com deficiência. Embora as estatísticas oficiais sobre o tema sejam limitadas, há registros de casos que evidenciam essa realidade (Bernardes, 2024). Indivíduos com deficiência, frequentemente criminalizados, tornam-se alvos de diferentes formas de violência institucional, incluindo abordagens abusivas, uso excessivo da força e violações sistemáticas de direitos. Atitudes capacitistas, suposições equivocadas e estereótipos negativos moldam muitas das interações entre essas pessoas e as autoridades, resultando em tratamentos discriminatórios e desproporcionais (Dowse et al., 2021).
A relação entre violência e deficiência configura um ciclo vicioso: a violência pode levar ao surgimento de
uma deficiência, e essa condição, por sua vez, aumenta a vulnerabilidade da pessoa a novas agressões. Assim, a prevenção da violência não deve se restringir à proteção das vítimas, mas também incluir estratégias que impeçam o desenvolvimento e o agravamento de deficiências decorrentes dessas agressões (Wanderer e Pedroza, 2015).
Diante desse contexto, é fundamental que políticas públicas e iniciativas de proteção sejam aprimoradas,
garantindo que pessoas com deficiência tenham seus direitos assegurados e possam viver sem medo da violência. A compreensão aprofundada desse fenômeno é essencial para embasar estratégias de prevenção e proteção mais eficazes. No contexto brasileiro, a análise estatística da violência contra pessoas com deficiência permite dimensionar a gravidade do problema e orientar ações mais assertivas.
Estatísticas sobre violências não letais
Esta seção se baseia em duas fontes de dados para analisar a violência contra pessoas com deficiência, considerando tanto o número absoluto de notificações quanto as taxas relativas à população. A primeira fonte é o Sinan, que reúne notificações feitas por profissionais de saúde sobre casos de violência interpessoal ou autoprovocada atendidos em serviços públicos e privados. No que diz respeito à deficiência, o registro é realizado a partir de um diagnóstico clínico emitido por um profissional de saúde, sem necessidade de comprovação documental.
A segunda fonte utilizada é a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2013, conduzida pelo IBGE, cujos
dados serviram para estimar a população com deficiência em 2023, por meio da projeção das proporções identificadas na pesquisa original. Embora ambas as bases adotem conceitos semelhantes de deficiência, a forma de declaração difere: no Sinan, a informação é registrada por um profissional de saúde, enquanto na PNS a deficiência é autodeclarada pelo próprio indivíduo ou por seu responsável (IBGE, 2021).
Importante ressaltar que o conceito de deficiência aqui adotado difere do estabelecido na legislação atual, que estabelece que a avaliação da deficiência deve ser biopsicossocial (Lei nº 13.146/2015), o que implica em considerar para a caracterização da deficiência não apenas o diagnóstico clínico, mas também as barreiras e os fatores contextuais que impedem a plena inclusão social. Entretanto, como a avaliação biopsicossocial ainda não foi regulamentada pelo Poder Executivo, os dados disponíveis sobre deficiência refletem essencialmente as condições de saúde, em razão das fontes das informações.
Optou-se por excluir do escopo do estudo as violências autoprovocadas, concentrando-se exclusivamente nas interpessoais. Além disso, a análise segue o modelo médico de deficiência, alinhando-se à metodologia empregada pelas bases de dados consultadas. Para ampliar a compreensão sobre o tema, também são incluídos dados sobre transtornos mentais, reconhecidos como deficiência mental pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, com a ressalva de que essa categoria não integra o cálculo das taxas, devido às diferenças conceituais entre as bases utilizadas.
O Gráfico 8.1 apresenta a taxa de notificações de violências contra pessoas com deficiência por 10 mil
habitantes, por sexo e tipo de deficiência no ano de 2023
A análise dos dados por tipo de deficiência (intelectual, física, auditiva e visual) revela que a maior
incidência de vítimas continua entre pessoas com deficiência intelectual, assim como observado nos
anos anteriores. A taxa registrada para esse grupo é de 47,8 casos por 10 mil indivíduos com deficiência,
seguida pela deficiência física (16,0), auditiva (5,2) e visual (1,9)
A Figura 8.1 apresenta quatro mapas temáticos do Brasil, divididos por Unidades da Federação (UF), mos trando a taxa de notificação de violência contra pessoas com deficiência em 2023, segundo o tipo de deficiência: auditiva, física, intelectual e visual. As regiões Sudeste e Centro-Oeste aparecem com maior frequência entre os estados com altas taxas de notificação, independentemente do tipo de deficiência. A deficiência intelectual apresenta as taxas mais altas entre os quatro tipos de deficiência, com concentração acentuada nos estados de Goiás, Mato Grosso do Sul, Paraná, São Paulo, Santa Catarina e Espírito Santo. A notificação de violência contra pessoas com deficiência auditiva tem maior concentração no Centro-Oeste, Sul e Sudeste. A violência contra pessoas com deficiência física apresenta taxas particularmente elevadas na Região Sul e Sudeste. A deficiência visual tem as menores taxas absolutas entre os quatro tipos analisados.
Observa-se também que as taxas são mais elevadas entre as mulheres em comparação aos homens,
especialmente no caso da deficiência intelectual, em que o índice chega a 75,5 por 10 mil mulheres, contra 28,9 entre os homens. Essa diferença se repete nos demais tipos de deficiência: na deficiência física, as taxas são de 24,9 para mulheres e 10,3 para homens; na auditiva, 7,5 para mulheres e 3,3 para homens; e no visual, 2,2 para mulheres e 1,5 para homens. A Tabela 8.1 apresenta esses dados.
O Gráfico 8.2 apresenta o número de notificações de violências contra pessoas com deficiência, discrimina das por tipo de deficiência, no período de 2013 a 2023. Observa-se um crescimento nas notificações para todas as categorias ao longo dos anos, com duas exceções: em 2020, houve uma redução generalizada, enquanto, no caso da deficiência visual, a queda ocorreu em 2022, seguida de um novo aumento em 2023.
Entre os diferentes tipos de deficiência, a intelectual registrou os maiores números de notificações
em todos os anos, passando de 2.495 registros em 2013 para 5.157 em 2023, o que representa um
crescimento de 107%. A deficiência física foi a segunda mais notificada, com um aumento de 174% no
período, subindo de 1.631 registros em 2013 para 4.476 em 2023. Já a deficiência visual apresentou um
crescimento de 131%, passando de 631 para 1.460 notificações, enquanto a deficiência auditiva registrou
um crescimento de 149%, saltando de 495 notificações em 2013 para 1.235 em 2023.
O crescimento do número de notificações de violências contra pessoas com deficiência ao longo do tempo pode ser atribuído a diversos fatores, como o crescimento populacional e envelhecimento da população, maior acessibilidade e capilaridade dos canais de denúncia, maior conscientização pública, melhoria na capacitação dos profissionais e serviços de atendimento, alterações legislativas e políticas públicas, maior visibilidade da violência contra grupos vulneráveis e, obviamente, aumento real da violência.
Os números revelam um padrão preocupante de maior exposição das pessoas com deficiência à violência, com destaque para aquelas com deficiência intelectual, que apresentam os valores mais elevados. A discrepância entre os sexos também chama atenção, já que as mulheres são mais vitimadas em todas as categorias, o que indica a sobreposição de fatores de vulnerabilidade. Esses resultados evidenciam a urgência de ações que não apenas combatam a violência, mas também promovam ambientes mais seguros e acessíveis, levando em conta as particularidades de cada grupo
Contexto e autoria da violência
O Quadro 1 organiza os casos de violência em cinco grupos, com base nos autores presumidos registra
dos no Sinan. A categorização segue a classificação proposta pelo guia do Ministério da Saúde (Brasil, 2016a) e está alinhada às definições da Organização Mundial da Saúde (OMS), que distingue três tipos principais de violência: autoprovocada, interpessoal (abrangendo tanto o ambiente doméstico quanto o comunitário) e coletiva. Conforme já mencionado, as notificações de violência autoprovocada não foram incluídas na análise.
O Gráfico 8.3 apresenta as notificações de violência contra pessoas com deficiência em 2023, segmentadas por tipo de deficiência e grupo de contexto/autoria. A violência doméstica foi a mais frequente, totalizando 11.344 registros, seguida pela violência comunitária, com 4.831 ocorrências. O tipo misto contabilizou 3.221 notificações, enquanto a violência institucional registrou 617 casos.
Entre os diferentes tipos de deficiência, pessoas com transtorno mental foram as mais afetadas pela vio lência doméstica, com 5.259 registros, seguidas por aquelas com deficiência física (1.909) e múltipla (1.870).
Além disso, os maiores percentuais de violência doméstica foram observados entre pessoas com deficiência física (66%) e visual (59,7%). Já a violência comunitária foi mais comum entre pessoas com deficiência intelectual (29,3%), enquanto aquelas com deficiência física apresentaram a menor incidência nesse contexto (17,4%).
As mulheres foram as principais vítimas em todas as categorias de violência, com a violência doméstica
liderando as notificações. Dentro desse grupo, a maior parte dos registros (4.321) ocorreu entre mulheres com transtorno mental (Tabela 8.2).
Os dados evidenciam a vulnerabilidade das pessoas com deficiência no ambiente doméstico, onde deve
riam encontrar maior proteção. O predomínio das mulheres entre as vítimas, visto também em anos anteriores, reforça a interseção entre deficiência e gênero como fator de risco, destacando a necessidade de políticas públicas voltadas à prevenção e ao apoio direcionado a essas vítimas. Além disso, a maior incidência de violência comunitária entre pessoas com deficiência intelectual sugere desafios específicos de inclusão e proteção nesses espaços, especialmente quando elas se encontram em instituições de longa permanência.
O Gráfico 8.4 apresenta a distribuição das notificações de violência contra pessoas com deficiência,
considerando o contexto, a autoria e as diferentes faixas etárias. As notificações são menos frequentes entre crianças de 0 a 9 anos (7,8%), mas aumentam significativamente na adolescência, atingindo 21,2% entre 10 e 19 anos, faixa etária com a maior incidência. A partir dos 20 anos, observa-se uma redução gradual nos registros: 15,7% entre 20 e 29 anos, 14,7% entre 30 e 39 anos, 13,9% entre 40 e 49 anos, até alcançar 4,6% entre pessoas com 80 anos ou mais.
A violência doméstica é a mais recorrente em praticamente todas as faixas etárias, seguida pela violência
comunitária e, em menor proporção, pela violência institucional. Os dados evidenciam que a incidência da violência varia conforme a faixa etária, sendo mais elevada na adolescência e juventude, especialmente no ambiente doméstico. Crianças e adolescentes com deficiência apresentam maior vulnerabilidade, o que reforça a necessidade de medidas de proteção específicas para esse grupo (Tabela 8.3)
Natureza da violência
A classificação da “natureza da violência” seguiu os cinco grupos definidos pelo Ministério da Saúde (Brasil, 2016a), conforme detalhado no Quadro 2. Esses grupos incluem: i) Violência física; ii) Violência psicológica, que também abrange aspectos financeiros e econômicos; iii) Violência sexual; iv) Negligência ou abandono; e v) Outras formas de violência, categoria que engloba casos de tortura, tráfico de pessoas, trabalho infantil, intervenção legal, entre outros.
O Gráfico 8.5, que apresenta as notificações de violência contra pessoas com deficiência segundo a natureza da violência e o tipo de deficiência, evidencia que a violência física foi a mais relatada, representando 52,6% dos registros. Em seguida, aparecem a violência psicológica (31,0%), a violência sexual (22,3%) e a negligência ou abandono (21,4%), enquanto outras formas de violência somam 6,2% das notificações.
Entre os diferentes tipos de deficiência, pessoas com transtorno mental concentraram o maior número
absoluto de notificações em todas as categorias de violência, totalizando 9.729 registros (Tabela 8.4). Em relação ao tipo de violência, a física tem mais vítimas entre pessoas com deficiência auditiva (59,2%), a psicológica afeta mais as pessoas com deficiência visual (52,6%), a negligência/abandono afeta mais as pessoas com deficiência múltipla (36,5%), e a violência sexual afeta mais as com deficiência intelectual (35,1%).
A análise por gênero revela padrões distintos de vitimização. Entre as mulheres com deficiência intelectu
al, a violência sexual foi a mais notificada (43,8%), superando a violência física (42,1%). Já entre os homens, aqueles com deficiência múltipla e física apresentaram índices elevados de negligência e abandono, com 45,9% e 41,5%, respectivamente.
O Gráfico 8.6 apresenta o número de notificações de violência contra pessoas com deficiência, cate gorizadas por natureza da violência e faixa etária. Observa-se que a faixa etária de 10 a 19 anos registrou o maior número de notificações, com a violência sexual sendo a mais prevalente nesse grupo. No que se refere à negligência e abandono, verifica-se que os extremos de idade são os mais afetados, com índices elevados entre 0 e 19 anos e 60 anos ou mais. Já a violência física apresentou maior número de notificações na faixa de 20 a 49 anos, quando comparada às demais formas de violência.
Em relação ao gênero, meninas e mulheres com deficiência entre 0 e 19 anos apresentam os maiores per centuais de violência sexual, enquanto meninos de 0 a 9 anos são mais afetados por negligência e abandono. A violência física é mais frequente entre mulheres de 20 a 59 anos e entre homens de 10 a 69 anos.
A negligência e o abandono são as formas de violência mais comuns entre idosos com 80 anos ou mais,
atingindo 76,1% dos homens e 74% das mulheres. Além disso, a violência psicológica contra mulheres é mais elevada em comparação com os homens, especialmente na faixa etária de 40 a 59 anos, com taxas de 45,4% entre 40 e 49 anos e 43,5% entre 50 e 59 anos. Em contrapartida, os homens na mesma faixa etária apresentam índices significativamente menores, variando entre 19,7% e 24,6% (Tabela 5).
A interseção entre idade e gênero exerce um papel central na dinâmica da violência contra pessoas com
deficiência. O tipo de violência ao qual as mulheres estão mais expostas depende da fase da vida em que se encontram. Na infância e adolescência, a violência sexual e a negligência/abandono são as formas mais recorrentes.
Entre 20 e 59 anos — período em que muitas mulheres estão em relacionamentos conjugais — a violência física e psicológica se torna predominante. Já na velhice, a negligência e o abandono passam a ser as principais formas de violência sofridas.
Sobre violência doméstica e reincidência
Considera-se violência doméstica quando ao menos um agressor for pai, mãe, madrasta, padrasto, cônjuge, ex-cônjuge, namorado(a), ex-namorado(a), filho(a), irmão(ã) ou cuidador(a), entre outros. A ficha de notificação de violência interpessoal/autoprovocada do SINAN inclui a pergunta: “Ocorreu outra vez?”. As opções de resposta — “Sim”, “Não” ou “Ignorado” — permitem avaliar a reincidência da violência doméstica. A variável “tipo de violência” categoriza os diferentes tipos de agressões notificadas.
A Figura 08 ilustra a distribuição das violências individualizadas ao longo do ciclo de vida entre 2013 e
2023, relacionadas à violência doméstica contra mulheres com deficiência. As combinações de agressão são apresentadas de forma individualizada, uma vez que a categoria “Múltiplas” agrupa diferentes tipos de agressões, o que oculta as especificidades de cada forma de violência cometida.
Nos extremos etários, observa-se uma maior incidência de negligência. A partir dos 12 anos até os 60 anos, a violência física se torna predominante entre os casos registrados de violência múltipla. A violência sexual, por sua vez, apresenta maior ocorrência entre os 6 e 20 anos. Ao se analisar as ocorrências de violência múltipla notificadas, verifica-se que, na infância e na adolescência, elas resultam da combinação de violência física, sexual e negligência. Já entre as pessoas idosas (60 anos ou mais), a violência múltipla decorre, principalmente, da associação entre negligência e violência física.
Os dados apresentados ressaltam a necessidade de uma abordagem coordenada para avaliar as causas da violência contra pessoas com deficiência, bem como para desenvolver políticas eficazes de prevenção, tratamento e apoio às vítimas. Em particular, a elevada incidência de violência sexual entre mulheres com deficiência intelectual e mental exige maior investigação e medidas concretas.
Heijden (2014) aponta que falhas no planejamento, na implementação e na avaliação de ações voltadas à
prevenção da violência contra pessoas com deficiência evidenciam a necessidade urgente de avanços nessa área.
Serviços especializados para apoiar pessoas com deficiência em situação de violência doméstica são essenciais, mas ainda são escassos (Dammeyer e Chapman, 2018). O aprimoramento dessas intervenções é crucial para garantir proteção, autonomia e dignidade às pessoas com deficiência, promovendo um ambiente mais seguro e inclusivo.
Desmantelar o capacitismo, incorporando e valorizando as vozes de pessoas com deficiência, além de
realizar a coleta de dados sobre deficiência de maneira mais intencional e sistemática em todos os esforços nacionais relacionados à violência e à sua prevenção, são medidas essenciais para garantir a proteção dos direitos humanos desse grupo.
Fonte: https://www.ipea.gov.br/