Entidade defende que a escolarização de crianças com deficiência permaneça na rede regular e pede revisão de pontos ambíguos do Decreto nº 12.686/2025
A Associação Nacional para Inclusão das Pessoas Autistas – Autistas Brasil divulgou uma nota técnica com uma carta aberta ao Ministério da Educação manifestando preocupação com o Decreto nº 12.686/2025, que institui a Política Nacional de Educação Especial Inclusiva e a Rede Nacional de Educação Especial Inclusiva.
De acordo com a entidade, o texto do decreto apresenta avanços importantes, como a proibição de laudo médico para acesso ao Atendimento Educacional Especializado (AEE) e a criação de núcleos de acessibilidade nas universidades federais. No entanto, também introduz ambiguidades e contradições que podem fragilizar o princípio constitucional da educação inclusiva.
Entre os principais pontos de alerta, a Autistas Brasil destaca que o decreto utiliza expressões como “preferencialmente” e “excepcionalmente” para definir a matrícula na rede regular de ensino e a oferta do AEE. Para a organização, esses termos abrem margem para interpretações regressivas e a reintrodução de práticas segregadoras, legitimando a separação de estudantes com deficiência sob o argumento de “decisão familiar”.
“A criança não é objeto de escolha familiar — é sujeito de direito. Nenhuma vontade privada pode limitar o direito público à convivência e à aprendizagem comum”, afirma Guilherme de Almeida, presidente da Autistas Brasil.
A entidade argumenta que, ao deslocar a responsabilidade da inclusão do Estado para as famílias, o decreto transforma o direito em escolha e enfraquece o dever estatal. Em um país marcado por desigualdades, alerta, essa “liberdade de escolha” tende a reproduzir exclusões: os que têm recursos escolhem, os que não têm são escolhidos pelo sistema.
Na análise jurídica e pedagógica, a Autistas Brasil defende que o novo decreto seja interpretado conforme à Constituição Federal, à Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) e à Lei Brasileira de Inclusão (LBI). A entidade recomenda a edição de portarias ministeriais complementares que assegurem a continuidade da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI/2008), revogada pelo texto atual.
A organização propõe ainda a criação de um conselho consultivo nacional com representação das pessoas com deficiência e de suas entidades, a regulamentação da formação dos profissionais de apoio e do AEE e a instituição de indicadores públicos de acessibilidade e permanência escolar.
Segundo Guilherme de Almeida, “o futuro da política inclusiva brasileira não será decidido apenas por decretos, mas pela maneira como o país escolher compreender o outro: como peso ou como possibilidade”.
A Autistas Brasil encerra o documento reafirmando que a educação inclusiva é um direito humano inalienável, e que nenhuma decisão familiar, institucional ou orçamentária pode restringir esse princípio. “Uma nação só se torna justa quando todas as suas crianças — todas, sem exceção — têm o direito de aprender juntas.”
Sobre a Autistas Brasil
A Autistas Brasil atua desde 2020 na defesa dos direitos das pessoas autistas, com foco em autodefensoria, educação inclusiva e inserção no mercado de trabalho. Fundada por lideranças autistas, é reconhecida por seu modelo de autorrepresentação e por promover o protagonismo das pessoas neurodivergentes em espaços decisórios e de inovação.






