Dados mostram que pessoas com deficiência ainda entram mais tarde no mercado de trabalho e têm menos chances de atuar na área em que se formaram — mesmo com qualificação de ensino superior
Muita gente sonha em estudar, se formar e trabalhar na área que escolheu. Para grande parte das pessoas com deficiência, porém, esse caminho é mais longo, solitário e desigual. Mesmo depois de conquistar um diploma, muitas vezes com esforço redobrado, elas ainda enfrentam barreiras para ingressar no mercado e, quando conseguem, raramente atuam na profissão para a qual se qualificaram. Segundo pesquisa realizada pelo IBGE, apenas 26,6% das pessoas PcDs estão empregadas no Brasil, menos da metade da taxa entre pessoas sem deficiência (60,7%).
Essa discrepância também se reflete no momento da entrada no mercado. De acordo com dados da mesma pesquisa, a maior concentração de pessoas com deficiência em empregos formais está entre 30 e 49 anos, indicando que a inserção profissional costuma acontecer mais tarde que a média dos profissionais, muitas vezes depois de repetidas tentativas de contratação.
Para Ana Paula Prado, CEO da Redarbor Brasil, detentora do Infojobs, “A busca por uma oportunidade não é só sobre encontrar uma vaga, mas sobre entender se aquele ambiente realmente permite que você cresça. Por isso, além da necessidade do aumento de oportunidades, as empresas devem deixar claro na descrição da vaga e nas etapas do processo, quais são os caminhos que esse profissional têm dentro da equipe, nível de acessibilidade e entrevistas inclusivas. Ter acesso a essas informações ajuda cada pessoa a tomar decisões mais conscientes sobre a preparação do ambiente para construir sua trajetória profissional.”
O cenário se torna ainda mais preocupante quando se olha para quem conseguiu avançar na educação. Entre as pessoas com deficiência com ensino superior completo, apenas 54,7% participam da força de trabalho, um índice 29,5 pontos porcentuais menor do que o observado entre pessoas sem deficiência de mesma escolaridade. Ou seja: o diploma chega, mas a oportunidade não acompanha.
Para a CEO, esses números revelam uma contradição estrutural: “Quando uma pessoa com deficiência precisa superar barreiras antes mesmo de ser considerada para uma vaga, estamos falando de um sistema que ainda não foi desenhado para todos. E, mesmo quando essas pessoas chegam às oportunidades mas não encontram compatibilidade com sua qualificação ou caminhos claros para crescer, isso não é apenas uma perda individual, é uma perda estratégica para as empresas, que deixam de acessar competências valiosas por falta de estruturas realmente inclusivas”, afirma.
Outro entrave importante é a informalidade: segundo relatório da Coordenação Geral de Inclusão de Pessoas com Deficiência (CGIE/2023), 55% dos profissionais PcDs empregados trabalham de forma informal, contra 38,7% de pessoas sem deficiência no mesmo cenário. Isso amplia desigualdades e reduz ainda mais as chances de atuação em áreas técnicas ou especializadas.
Segundo Ana Paula Prado, esse é um sinal claro de que a inclusão precisa mudar de patamar: “Não podemos tratar inclusão como um check-list. Só no site Infojobs, por exemplo, são mais de 400 mil profissionais PcD buscando oportunidades. As empresas precisam olhar para as vagas para pessoas com deficiência para além do cumprimento de cotas e conhecer a fundo o currículo dessas pessoas. Precisamos garantir que esses profissionais tenham acesso a carreiras alinhadas às suas ambições e ao seu potencial, como todas as pessoas devem ter”, destaca.
O que pode ser feito pelas empresas
A especialista listou algumas ações que podem ser tomadas para trazer transformações nesse cenário:
- Mapeamento entre formação e vaga: acompanhamento das empresas em relação a quantas contratações de pessoas com deficiência acontecem, de fato, em suas equipes e onde podem surgir novas oportunidades, respeitando suas áreas de formação.
- Processos seletivos inclusivos: avaliações, descrições de vagas e entrevistas precisam eliminar barreiras que afastam candidatos qualificados por conta de suas características clínicas.
- Planos de desenvolvimento e carreira: garantir que profissionais contratados avancem na área escolhida — e não fiquem presos a funções operacionais.
- Olhar analítico ao local de trabalho para tornar o ambiente profissional qualificado e acessível para profissionais com diferentes necessidades de deslocamento, autonomia e conforto.
- Criação de vagas afirmativas de liderança para pessoas com deficiência.
“Precisamos oferecer a esses profissionais processos seletivos mais consistentes e recursos que aproximem, com precisão, suas qualificações das oportunidades disponíveis no mercado. Quando conseguimos fazer essa leitura mais profunda, entendendo competências, interesses e potencial de cada pessoa, abrimos espaço para que profissionais com deficiência construam suas trajetórias em áreas alinhadas aos seus perfis, e não em posições que subaproveitem seu talento. Esse é o caminho para uma inclusão que realmente transforma”, conclui a CEO da Redarbor Brasil, detentora do Infojobs.





