OPINIÃO
- * Por Márcio Todeschini
A palavra “afeto” tem a mesma origem de afeiçoar-se, do latim “affectus”. Numa pesquisa rápida você vai descobrir que “o ato de afeiçoar-se a alguém está relacionado a criar um vínculo, um sentimento de carinho ou ligação afetiva.” É o que se vê em alguns grupos de pessoas que convivem juntas por algum tempo. Elas passam a ter comportamentos parecidos, as mesmas expressões, o mesmo jeito de se expressar, por vezes, passando a usar gírias. Surge quase que um dialeto próprio, ou seja, há um vínculo afetivo que faz com que se pareçam cada vez mais umas com as outras, simplesmente pelo fato de estarem próximas no dia a dia. As relações humanas podem ser marcadas pelo afeto, ou pela falta dele; por vínculos afetivos ou pela falta deles, a depender sempre de como nos projetamos nessas realidades. São muitas as situações, nas quais somos desafiados a dar qualidade afetiva às nossas relações. Mas, para que haja o afeto, é preciso uma decisão: sair de si mesmo em direção ao outro, e fazer bem ao seu coração.
Em tempos de acirramentos ideológicos e do exagerado protagonismo nas redes sociais, somos levados por correntes de ódio, egoísmo, vingança e revanchismos. Enquanto nosso ego se ilude com as “curtidas”, nossa alma se alimenta do vazio. Precisamos ter a coragem de pensar e agir diferente. Dizer não à cultura do cancelamento, do linchamento virtual, da lacração, e respeitar o próximo. Abrir-se à escuta honesta, utilizar palavras gentis e de afeto. Urge em nossos relacionamentos atitudes que nos aproximem, afinal o outro não é meu inimigo só porque pensamos diferente.
Aquilo que temos de melhor, precisa ser repartido com o outro, para o bem do outro. Aprendi isso em pouco mais de 20 anos, como membro de uma Comunidade Católica, que “quem partilha é mais feliz”. Aqui fazemos o propósito de abrir mão de tudo, colocando tudo em comum, para que não falte nada a ninguém. Posso testemunhar que isso é verdade, e que me sinto muito mais feliz do que quando era funcionário público ganhando quase o dobro do que recebo hoje para o cuidado da minha família.
Uma vez que entendemos a razão pela qual Deus nos quis assim, que isso faz parte de um chamado, de uma vocação, e que devemos dar a nossa resposta, vamos tocando no cuidado de Deus, que sempre vem em nosso auxílio. Mas e você, aí onde você está, onde vive, qual tem sido a sua resposta diante desses desafios? Sente que corresponde à sua vocação? Mesmo que você não viva como eu, todos temos uma comunidade “raiz”, que é a nossa casa. Num tempo onde quase tudo se resolve com a tecnologia na palma da mão, sempre chega o momento de olhar nos olhos para cumprimentar ou apertar a mão de alguém. Esse é o momento, no qual podemos dar uma resposta diferente e extirpar o câncer da indiferença, que tem adoecido as nossas relações.
Deus amou tanto o mundo, que deu o seu único filho para nos salvar. Deus desceu do Céu para assumir a nossa carne corrompida pelo pecado. Ele quis se parecer conosco e carregar em seus ombros os nossos pecados. Este ato de amor que vincula afetivamente para sempre Deus e o homem, também o redime, quando o mesmo Deus morre na Cruz e ressuscita para o salvar. Sua ressurreição é a prova de que o amor é mais forte que o sofrimento e a morte. Aprendemos com Ele que tudo o que fizermos, se não tiver o amor que dá a vida, de nada vale. O amor, o afeto, o querer bem, precisam vencer a indiferença nas nossas relações humanas, o egoísmo, e fazer com que o outro se sinta bem, valorizado e feliz. É possível mudar o rumo dessa história, só depende de mim e de você!
* Márcio Todeschini é missionário da Comunidade Canção Nova, na qual atua como músico, cantor e analista de dados; casado e pai de quatro filhos.