OPINIÃO
- Por Régis de Oliveira Júnior
O Brasil precisa de um avanço urgente na inclusão, e a Inteligência Artificial (IA) é um recurso valioso, capaz de acelerar a superação da resistência política e da precarização estrutural da educação.
O custo da negligência do Estado é pago por milhões de famílias atípicas que esperam por direitos e diagnósticos, uma dor que se multiplica diariamente. A crise estrutural da saúde começa no SUS, onde a falta de regulação eficaz para a fila de especialidades, como a neuropediatria, impõe uma espera prolongada e inaceitável.
Esse atraso é crítico para o diagnóstico e a intervenção precoce em condições como TDAH, TEA, Síndrome de Down, deficiência física, deficiência auditiva e deficiência intelectual, intensificando a dificuldade de diagnóstico e contribuindo para o excesso de medicação como paliativo.
Os dados preliminares do Censo IBGE 2022 revelam que o Brasil tem 14,4 milhões de pessoas com deficiência. Muitas escolas não recebem investimentos para adaptar espaços ou contratar monitores capacitados e bem remunerados, o que impede o direito à qualidade.
“Tecnologia sem compromisso humano não transforma nada”.
O Censo também mostra que 2,9 milhões de pessoas com deficiência acima de 15 anos são analfabetas e que 63,1% das pessoas com 25 anos ou mais não concluíram o ensino fundamental. A exclusão não atua de forma isolada. Ela se organiza pela lógica do capacitismo, que se sobrepõe à pobreza, à raça, ao gênero, à religião e à idade.
Essa sobreposição multiplica barreiras e aprofunda desigualdades. Para um cadeirante que também enfrenta vulnerabilidade social, por exemplo, a discriminação é ampliada e o acesso a direitos se torna ainda mais restrito. Essa combinação revela que a inclusão exige políticas estruturais e intenção concreta de garantir pertencimento.
Nesse contexto, o entendimento técnico da psicóloga Renata Plácido Dipp, da PUC RS, se torna fundamental. Em debate recente, ela reforçou a necessidade de evitar generalizações no uso da IA na inclusão. A partir do modelo social da deficiência, o problema não está na pessoa, e sim na forma como os espaços e relações ao redor dela impedem sua
participação.
Sua tese destaca que a IA tem grande potencial para ampliar a equidade, mas não pode ser tratada como solução universal, já que muitas barreiras são relacionais e dependem de mediação humana, vínculo e propósito ético de convivência com a diferença.
Isso não reduz o potencial da IA. Para o aluno, ela maximiza o hiperfoco, personaliza o aprendizado e fortalece a autonomia. A IA já personaliza currículos na Finlândia por meio de softwares adaptativos.
No Brasil, polos de inovação em Porto Alegre desenvolvem tecnologias assistivas com processamento de linguagem natural para apoiar a comunicação não verbal na rede pública. Para o educador, a IA funciona como assistente pedagógico que sugere intervenções e reduz a sobrecarga. O dever do Estado é investir de forma consistente.
Governos precisam criar salas multissensoriais, garantir equipes qualificadas e integrar tecnologia, estrutura e formação humana. A IA deve ser vista como parte de um ecossistema maior, que inclui combate ao capacitismo, redução de desigualdades e políticas que assegurem acesso real a direitos.
Inclusão não é adaptar a pessoa à escola, mas adaptar a escola e a sociedade à dignidade humana. A inclusão é a medida da nossa civilidade. A IA é um meio potente, desde que acompanhada de compromisso ético e disposição real para conviver com a diferença. Não precisamos ser apenas uma escola para todos, mas uma cidade para todos. Não somos
iguais, somos diferentes.
- * Régis de Oliveira Júnior é jornalista e especialista em Inteligência Artificial pela ESPM
Tech – @regisojr






