Instituto Serendipidade e especialista do Hospital Albert Einstein esclarecem equívocos comuns que ainda limitam a autonomia e o bem-estar de pessoas com deficiência intelectual
Desmistificar conceitos ultrapassados sobre a síndrome de Down é um passo fundamental para garantir mais inclusão, bem-estar e pertencimento em todos os aspectos sociais. Na área da saúde, por exemplo, o avanço das políticas de cuidado e as transformações na forma como a deficiência intelectual é percebida ainda esbarram em crenças equivocadas. O médico Marcelo Altona é geriatra do Hospital Israelita Albert Einstein e parceiro do Instituto Serendipidade, entidade que oferece apoio a pessoas com deficiência e suas famílias, com diversas ações de inclusão. Para ele, é preciso atualizar o olhar clínico e social: “Os pacientes com síndrome de Down devem ser tratados como qualquer paciente, independentemente da sua condição. O nosso desafio é romper estigmas ainda presentes quando se fala em saúde e inclusão”, afirma.
Nos últimos 40 anos, a expectativa de vida de pessoas com síndrome de Down mais que dobrou, saltando de cerca de 25 anos na década de 1980 para mais de 60 anos atualmente, de acordo com dados da Global Down Syndrome Foundation. Essa longevidade crescente é resultado direto do avanço nos cuidados médicos, do acesso a tratamentos específicos e, sobretudo, da mudança de mentalidade sobre o papel da pessoa com deficiência na sociedade. No entanto, como aponta o posicionamento do Instituto Serendipidade, é preciso viver com qualidade. E isso só é possível quando saúde física, emocional e inclusão caminham juntas.
Derrubar velhos conceitos e disseminar informação qualificada é parte essencial desse processo de transformação. A seguir, estão quatro mitos ainda presentes no imaginário coletivo — e o que diz a ciência sobre cada um deles.
1. Todas as pessoas com síndrome de Down têm atraso significativo no desenvolvimento.
Essa generalização não corresponde à realidade. Embora seja comum algum grau de comprometimento cognitivo, o desenvolvimento intelectual e motor de pessoas com síndrome de Down varia amplamente de indivíduo para indivíduo. Fatores como ambiente familiar, acesso a terapias, escolarização e estímulos precoces têm impacto direto na evolução de habilidades sociais, comunicativas e acadêmicas. Estudos mostram que, com apoio multidisciplinar adequado e contínuo — envolvendo fonoaudiologia, fisioterapia, terapia ocupacional e acompanhamento psicopedagógico —, muitas pessoas com a condição conseguem atingir níveis significativos de autonomia, aprender a ler, escrever, trabalhar, participar ativamente da vida em comunidade, inclusive, morando sozinho.
2. Pessoas com síndrome de Down têm mais chances de desenvolver cardiopatias e câncer.
Apenas as cardiopatias congênitas são mais frequentes entre pessoas com síndrome de Down — estima-se que cerca de 50% nasçam com alguma anomalia cardíaca. Até a década de 1970, isso reduzia significativamente a expectativa de vida, já que muitas famílias não encontravam respaldo para realizar cirurgias. Hoje, esse cenário mudou. Graças aos avanços da medicina e ao acesso ampliado ao tratamento, a expectativa de vida ultrapassa os 60 anos. Em relação ao câncer, no entanto, a crença de que pessoas com Down têm maior risco não é sustentada por evidências sólidas. “Existem alguns tipos de leucemias e cânceres que são conhecidamente mais comuns nessa população, enquanto outros tipos de cânceres são mais raros. Sendo assim, dizer que a incidência de câncer em geral é maior nesta população é um erro ”, afirma Altona.
3. O envelhecimento precoce é inevitável e sem intervenção efetiva.
É verdade que os sinais de envelhecimento surgem mais cedo em pessoas com síndrome de Down: entre os 25 e 30 anos, há registros de perda de força muscular, catarata e declínio cognitivo. Um estudo realizado em Salvador (BA), por exemplo, apontou sintomas de depressão em cerca de 32% da amostra e início de perdas cognitivas ainda na juventude. No entanto, o mito está em acreditar que nada pode ser feito. O Instituto Serendipidade tem atuado com foco na promoção de hábitos saudáveis, estímulo cognitivo e apoio psicossocial como formas efetivas de prevenir ou retardar os impactos do envelhecimento precoce. Para o médico, o acompanhamento gerontológico precoce é essencial: “Com estímulo cognitivo, atividade física, dieta equilibrada e vínculos afetivos, é possível garantir mais qualidade de vida e autonomia”, reforça o médico.
4. Saúde mental e inclusão não impactam no desenvolvimento da pessoa com a síndrome.
Essa é uma das crenças mais prejudiciais, além de infundada. A forma como a pessoa com síndrome de Down é acolhida e incluída em seu ambiente familiar, escolar e comunitário tem impacto direto no seu bem-estar emocional e na evolução de suas capacidades. O Projeto Laços, por exemplo, iniciativa do Instituto Serendipidade, conecta famílias que recebem o diagnóstico com outras que já passaram pela mesma experiência, promovendo acolhimento, informação e redes de apoio desde os primeiros momentos. “A saúde emocional é um pilar da autonomia. O que vemos na prática é que inclusão e pertencimento transformam trajetórias”, reforça Henri Zylberstajn, fundador do Instituto Serendipidade. Para Altona, a inclusão social e os estímulos adequados também têm efeito na prevenção de condições como demência e depressão, comuns no envelhecimento precoce.
Envelhecimento Ativo
A promoção da longevidade com qualidade de vida é uma prioridade para o Instituto Serendipidade. Em parceria com o Dr. Marcelo Altona e a APOIE-SP (Associação para Profissionalização, Orientação e Integração do Excepcional), o programa Envelhecimento Ativo oferece acompanhamento integral e atividades voltadas ao bem-estar físico, emocional e social de pessoas com deficiência intelectual em processo de envelhecimento. A iniciativa combina conhecimento técnico, escuta humanizada e estímulo ao protagonismo, por meio de oficinas, atendimentos e apoio às famílias — fortalecendo vínculos, promovendo autonomia e valorizando cada etapa da vida.
Sobre o Instituto Serendipidade
O Instituto Serendipidade é uma organização sem fins lucrativos que potencializa a inclusão de pessoas com deficiência, com propósito de transformar a sociedade através da inclusão. Visa ser impulsor de impacto social relevante, colaborativo e inovador, sempre prezando pela representatividade, protagonismo, de forma transversal e acima de tudo, com muito respeito. As iniciativas que atendem diretamente o público são: Programa de Iniciação Esportiva para crianças com síndrome de Down e deficiência intelectual, de famílias de baixa renda; Programa de Envelhecimento que atende mais de 60 idosos com algum tipo de deficiência intelectual para promoção do bem-estar; e o Projeto Laços, que acolhe famílias que recebem a notícia de que seu filho (a) tem algum tipo de deficiência. Atualmente, o Serendipidade impacta mais de um milhão de pessoas, criando pontes, gerando valor em prol da inclusão e através do atendimento direto a pessoas com deficiência intelectual e suas famílias.
Mais informações em www.serendipidade.org.br E nas mídias sociais @institutoserendipidade