No dia 27 de junho comemora-se o Dia Internacional da Pessoa Surdocega. A surdocegueira é uma deficiência caracterizada pela ausência da audição e da visão de forma simultânea e em graus diferentes, não são duas deficiência juntas, mas uma deficiência única que precisa ser tratada de forma específica. As principais causas da surdocegueira são: síndromes genéticas (Síndrome de Down, Goldenhar, Marfan, Usher), diabetes, tumores cerebrais, AVC (Acidente Vascular Cerebral), meningites, choques anafiláticos. Nesta celebração do Dia Internacional da Pessoa Surdocega conversei com Alex Garcia, que é pessoa surdocega com hidrocefalia e também doença rara, a osteogênese imperfeita e ele forneceu maiores explicações sobre essa condição, a surdocegueira. Alex começa explicando mais sobre o conceito de surdocegueira e porque ele é funcional “A surdocegueira é uma condição única e não a simples soma de surdez e cegueira. Uma pessoa surdocega não consegue compensar plenamente um sentido com o outro. Enquanto pessoas cegas compensam a falta de visão com a audição e pessoas surdas compensam a falta de audição com a visão, as pessoas surdocegas enfrentam desafios na compensação. Pessoas surdocegas podem ter resíduos auditivos ou visuais, mas ainda assim não conseguem compensar totalmente a perda do outro sentido. No Brasil e em outros lugares, essas questões são frequentemente negligenciadas, resultando em muitas pessoas surdocegas que não têm consciência de sua condição. A falta de políticas públicas específicas e a falta de compreensão da importância da comunicação receptiva para o desenvolvimento humano agravam ainda mais essa situação. A barreira principal para as pessoas surdocegas está na comunicação receptiva, o que afeta diretamente seu desenvolvimento.”
Alex Garcia tem uma vida inteira dedicada ao estudo e a luta por direitos das pessoas surdocegas e demais pessoas com deficiência, Alex foi a primeira pessoa surdocega a se pós-graduar no Brasil. Mais sobre a história de vida de Alex pode ser lido nesse link.
Sobre a importância do Dia Internacional da Pessoa Surdocega ele diz “O Dia Internacional colabora e muito no sentido de nos presentear visibilidade, equidade e acima de tudo empoderamento. Justamente, precisamos de muito mais humanidade, e porque não, muito mais vergonha na cara, menos egoísmo, menos cobiça, e muito menos “tretas”, para promover mudanças significativas para nós pessoas surdocegas.
Alex tem um vários feitos dignos de nota e um deles é seu poema “Sonhos de um Surdocego”, que conta com tradução para mais de 20 idiomas e se tornou uma bandeira da luta das pessoas surdocegas e ele diz “O poema nasceu justamente daquela minha inquietação natural e de um ensinamento de Johann Goethe que marcou minha vida: ‘Qualquer coisa que você possa fazer ou sonhar, você pode começar. A ousadia tem genialidade, poder e magia em si’. Eu fiz algo ousado ao escrever os ‘Sonhos de um Surdocego’, mas, creio na genialidade e poder destes Sonhos. Nunca podemos desistir de que um Dia estes Sonhos se tornarão realidade! Escrevi este poema num raro momento de lucidez para amenizar um momento de angústia… E, para minha surpresa ele se tornou uma bandeira de visibilidade para nós, pessoas surdocegas no Brasil, América Latina e Mundo. Da versão em Português, desenvolvi – com apoio de voluntários – a versão em Espanhol e Inglês! E com estas matrizes o poema já passou de 20 outros idiomas. Meu objetivo em ter o poema no maior número possível de idiomas e compartilhar com o mundo é exatamente esse: O poema é uma bela ferramenta de visibilidade. Quanto mais traduzido mais pode ser compartilhado, e, mais será lido em diferentes idiomas e então as populações do mundo se questionarão: “Surdocego? Este poema está destacando esses seres humanos. Há Pessoas surdocegas em nossa comunidade? População? Em nosso meio? Onde eles estão? Como vivem?” Para muitas pessoas isso parece utópico – sim, eu sei! Mas parece estar funcionando! Acreditem: meu poema enviou um sinal de esperança, um sorriso para muitas pessoas surdocegas e suas famílias que vivem em lugares e comunidades distantes deste Brasil e Mundo. Enquanto Deus me presentear entusiasmo e enquanto as pessoas de bom coração continuarem colaborando com as versões do poema, tenho certeza que poderei ir mais longe. Com o poema conquistei o terceiro lugar em um concurso russo de poesias e, ele, foi publicado na revista internacional da Cruz Vermelha.” Leia o poema na íntegra aqui.
Segundo a Feneis (Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos), estima-se que existam cerca de 40 mil surdocegos no Brasil. A comunicação de pessoas surdocegas enfrenta muitas barreiras e isso leva a uma maior dificuldade para a inclusão dessas pessoas na sociedade, mas existem diversas formas de suporte para os surdocegos e que podem facilitar sua inclusão, a seguir listarei algumas:
1. Intérpretes e língua de sinais: Um surdo de nascença tem a língua de sinais como a materna. Com a perda visual, o surdocego visualiza mentalmente as características de cada sinal através do movimento. Já o intérprete do surdocego, na maioria das vezes exerce também a função de guia e guia-intérprete.
2. Braille: A técnica Braille consiste de pontos em relevo que combinados formam letras e números. A técnica Braille constitui-se de “seis pontos não obrigatoriamente em relevo” para estabelecer uma comunicação, ou seja, onde houver a possibilidade de trabalhar “seis pontos”, a técnica Braille estará sendo usada e bem aceita.
3. Alfabeto dacticológico: Cada uma das letras do alfabeto corresponde a uma determinada posição dos dedos da mão. Trata-se do alfabeto manual utilizado pelas pessoas surdas. Apenas no caso da surdocegueira que esse alfabeto é adaptado para a versão tátil.
4. Tablitas de comunicação: Fabricadas em plástico sólido, as letras e os números são representados em relevo, assim como caracteres do sistema Braille. As letras e os números estão superpostos aos caracteres Braille. O dedo da pessoa surdocega é levado de uma letra/número a outra (o) ou de um caractere a outro, estabelecendo desta forma a comunicação.
Tablitas de comunicação
5. Letras de forma: A única condição necessária para que funcione é que nosso interlocutor conheça as letras maiúsculas do alfabeto: As letras são feitas na palma da mão, ou em qualquer outra parte do corpo do surdocego. Então o dedo indicador do interlocutor ou o dedo do surdocego funcionam como uma caneta.
6. Sistema pictográfico: Os símbolos de comunicação pictóricas – Picture Communication Symbols (PCS) fazem parte de um Sistema de Comunicação Aumentativa (CAA) que refere-se ao recurso, estratégias e técnicas que complementam modos de comunicação existentes ou substituem as habilidades de comunicação existentes. Em síntese, o sistema pictográfico consiste de símbolos, figuras, etc, que significam ações, objetos, atividades que entre outras características podem servir como símbolos comunicativos, tanto receptivamente quanto expressivamente
7. Tadoma: Sentir a fala pela vibração. A pessoa surdocega coloca a mão no rosto e pescoço de quem está falando. Assim, ela sente a vibração da voz e pode interpretar a mensagem.
Como promover a Inclusão de Pessoas Surdocegas
Existem diversas formas de promover a inclusão de pessoas surdocegas e algumas delas são: tecnologias assistivas (como comunicadores táteis e dispositivos Braille); preparo e acessibilidade nas escolas, universidades, empresas e órgãos públicos para que sejam usufruídos por pessoas surdocegas (adaptações arquitetônicas, sinalização tátil e materiais em Braille); educação inclusiva em escolas regulares (recursos de acessibilidade, como intérpretes de LIBRAS-tátil, materiais adaptados e apoio pedagógico específico).
É muito importante também que existam programas de capacitação profissional e emprego e isso pode incluir treinamentos específicos, adaptações dos ambientes de trabalho e conscientização sobre as necessidades e habilidades dessas pessoas e por último acompanhamento e apoio, pois pessoas surdocegas podem necessitar de acompanhamento individualizado, seja por profissionais especializados, amigos ou familiares.
A comunicação e a inclusão de pessoas surdocegas pode parecer algo bastante difícil, mas para que isso não se torne uma regra é necessária a atuação coletiva da sociedade e também programas de conscientização a respeito dessas pessoas e é necessário também tratar a surdocegueira como uma deficiência única, a fim de facilitar seu mapeamento e com isso a criação e a implantação de políticas públicas mais eficientes melhorando em muito a qualidade de vida dos surdocegos.
Fontes:
Louis Braille-Associação de Cegos
Fonte: Câmara Paulista para Inclusão | Por Sérgio Gomes* – *Sergio Gomes é jornalista, escreve para o site e redes sociais da Câmara Paulista para Inclusão e para o site e redes sociais do Instituto Modo Parités desde janeiro de 2022.