Em um país com quase 46 milhões de brasileiros que declaram ter algum grau de deficiência: física, visual, auditiva ou intelectual (Censo 2010), somente 372 mil deles estão atualmente no mercado formal de trabalho, de acordo com a Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, associada ao Ministério da Economia. Essa discrepância mostra que ainda persiste a triste realidade de pouca inclusão de PcDs no mundo corporativo.
“A pessoa com deficiência procura trabalho, mas tem dificuldade de encontrar ocupação, pois há pouca aceitação dos empregadores, preconceito; sem falar das dificuldades de acessibilidade para chegar ao local do emprego”, pontua o defensor público federal André Naves, especialista em Direitos Humanos e Sociais.
Mas apesar das dificuldades, esse quadro começa a mudar. Muitas empresas já começaram a contratar PcDs não apenas para cumprir a cota obrigatória por lei (para empresas com mais de 100 funcionários) mas sim por reconhecerem e valorizarem a diversidade em seu quadro de funcionários. Isso vem ocorrendo principalmente nas startups e empresas do setor de tecnologia. As AgTechs ou Agrotechs – startups com foco no agronegócio –, por exemplo, já têm 25% de funcionários de grupos minorizados.
“Percebo que várias empresas já estão atentas a esse movimento e querem ser mais inclusivas, mas ainda não sabem exatamente como fazer. Não dá para apertar um botão e do dia para a noite corrigir todo um desequilíbrio social de séculos, de menores oportunidades para esse público. Mas estamos vivendo um momento bom, porque o assunto está em alta e as empresas, principalmente as do setor de tecnologia, começaram a abrir as portas para PcDs”, frisa o defensor público.
De acordo com André Naves, algumas startups, inclusive, têm atuado bastante para ajudar nessas contratações. Ele cita o caso da Avulta, que criou uma ferramenta científica para a contratação específica de portadores de necessidades especiais. A empresa desenvolveu, em parceria com a Cia de Talentos, a ANA – Avaliação Neuropsicológica Avulta, uma metodologia gamificada baseada em neurociência que mapeia a funcionalidade de até 10 habilidades cognitivas. O objetivo é identificar o quão hábil a pessoa está para executar tarefas que envolvam competências, como percepção, raciocínio e foco.
“O objetivo da ferramenta é ajudar a alocar PcDs em funções que utilizem melhor suas competências e, assim, incentivar as empresas a promover uma seleção mais inclusiva. Eu li que desde setembro de 2022, a metodologia ANA já foi aplicada em 30 mil pessoas com deficiência que participaram de processos seletivos em empresas, como a Vale. Outra startup que atua nesse segmento é a Semearhis, que se autodenomina o Tinder da empregabilidade das pessoas com deficiência. A ideia da empresa é fazer o match entre o candidato e as necessidades do negócio”, ressalta.
Outra iniciativa elogiada pelo defensor público é a da Ipiranga, plataforma de mobilidade e conveniência que, com apoio pedagógico da Gama Academy – edtech voltada à formação de profissionais para o mercado de tecnologia -, lançou no mês passado o programa Inclusão Tech. O objetivo é capacitar e contratar pessoas com deficiência para atuar na empresa, na área de Product Design ou de Engenharia de Dados. O Inclusão Tech também vai preparar profissionais para atuarem no mercado de trabalho, estimulando a empregabilidade de mão de obra qualificada. O programa visa formar 300 pessoas até meados desse ano.
Mas André Naves ressalta que, além de contratar, as empresas têm que estar preparadas para proporcionar um ambiente de acolhimento a seus funcionários com deficiência, a fim de que se sintam à vontade no dia a dia de suas funções. “É preciso pensar no todo, desenvolver uma cultura inclusiva que funcione bem dentro da empresa, e que pode ser construída investindo em treinamentos e com o auxílio de especialistas que ajudem a criar um ambiente de trabalho inclusivo para todos os funcionários, inclusive os PcDs”, finalizou.