Pessoas com deficiência são ‘jabutis’ em projeto de Tarcísio aprovado na ALESP

Pessoas com deficiência são 'jabotis' em projeto de Tarcísio aprovado na ALESP - OPINIÃO - *Por Abrão Dib

OPINIÃO

  • * Por Abrão Dib

Governo Estadual menciona Pessoas com Deficiência em projeto que concede isenção para motociclistas e é aprovado em tempo recorde na ALESP

A análise do Projeto de Lei nº 1373/2025, enviado pelo Governador Tarcísio de Freitas à ALESP – Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, exige separar o discurso oficial, o desenho jurídico do texto e os efeitos políticos concretos. Feito isso, a crítica de que o projeto utiliza as Pessoas com Deficiência como “jabuti” não é retórica exagerada, mas encontra fundamento técnico e político no próprio conteúdo do processo legislativo.

O PL tem dois eixos distintos, colocados no mesmo texto legal:

🔹 Eixo A — Isenção ampla de IPVA para motocicletas até 150 cc

  • Beneficia qualquer pessoa física, sem critério de renda;
  • Entra em vigor em 1º de janeiro de 2026;
  • Impacto fiscal estimado: R$ 434 milhões em 2026, chegando a quase R$ 487 milhões em 2028 .

➡️ Esse é o núcleo verdadeiro da política pública do projeto, tanto do ponto de vista fiscal quanto eleitoral.


🔹 Eixo B — Cancelamento de débitos de IPVA de 2021 para Pessoas com Deficiência

  • Alcança apenas um veículo;
  • Restrito ao período 15/01/2021 a 31/12/2021;
  • Exige que o pedido de isenção tenha sido deferido (ainda que precariamente);
  • Não gera restituição de valores já pagos;
  • Produz efeitos imediatos, mas apenas retroativos e pontuais .

➡️ Trata-se de uma anistia corretiva, não de uma ampliação de direitos.

Do ponto de vista de técnica legislativa e análise política, há três sinais claros de jabuti:

Ausência de relação estrutural entre os temas

Isenção permanente de IPVA para motocicletas ≠ regularização pontual de débitos de PcDs.

Não há:

  • mesma temporalidade,
  • mesmo público-alvo,
  • mesma lógica de política pública.

A junção é artificial.


Desproporção de impacto fiscal e político

  • Motocicletas até 150 cc: bilhões em renúncia ao longo do tempo;
  • Pessoas com deficiência: impacto fiscal residual e encerrado no passado.

Ou seja, o grupo de pessoas com deficiência:

  • não recebe benefício estrutural novo;
  • é usado como escudo simbólico para suavizar críticas ao custo da renúncia principal.

Neutralização de conflitos jurídicos anteriores

O próprio ofício da Secretaria da Fazenda encaminhado em anexo ao Projeto de Lei admite que a medida decorre do caos jurídico criado em 2021, quando:

  • liminares afastaram restrições impostas pela Lei nº 17.293/2020;
  • decisões finais depois derrubaram essas liminares, abrindo espaço para cobranças retroativas .

➡️ O Estado:

  • erra na formulação da política,
  • perde na Justiça,
  • cria insegurança jurídica,
  • e depois concede uma “clemência seletiva”, sem reconhecer o erro nem reformar o modelo.

A lógica política por trás do desenho do projeto

🎯 Intenção central (real)

Construir uma política fiscal de alto impacto eleitoral, focada em:

  • motociclistas,
  • trabalhadores informais,
  • entregadores,
  • eleitores urbanos de baixa renda, em um contexto pré-eleitoral.

🛡️ Função política do “jabuti PcD”

  • Reduz resistência parlamentar;
  • Dificulta críticas públicas (“votar contra Pessoas com Deficiência?”);
  • Permite discurso de “sensibilidade social” sem custo estrutural;
  • Não reabre o debate central: a restrição atual e contínua dos direitos PcD no IPVA.

O que o projeto não faz

O PL deliberadamente evita:

  • restaurar a isenção ampla de IPVA para PcDs;
  • enfrentar o modelo excludente pós-Lei nº 17.293/2020;
  • corrigir o problema estrutural que gerou milhares de ações judiciais.

Isso revela que não há intenção de política pública inclusiva para Pessoas com Deficiência, apenas de encerramento contábil de um passivo político-jurídico específico.


Aproveitamento político pré-eleitoral

✔️ Sim, trata-se de um projeto com forte racionalidade eleitoral.
✔️ Sim, Pessoas com Deficiência são instrumentalizadas como “jabuti” legislativo.
✔️ O benefício PcD é pontual, exaurido e não expansivo.
✔️ O ganho político real está concentrado na isenção das motocicletas.

O projeto não é “confuso” por acidente — ele é deliberadamente híbrido, para combinar alto retorno eleitoral com baixo custo político.

  • Abrão Dib é jornalista profissional diplomado, editor do Diário PcD e está presidente da ANAPcD – Associação Nacional de Apoio às Pessoas com Deficiência.

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